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A Visita ao Senhor Vilázio
Não me identifico com nomenclaturas religiosas; minha fé, como a de muitos brasileiros, especialmente os nordestinos, se forma em meio a tantas crendices. Acredito tanto no milagre da Senhora Mãe de Jesus quanto nas doses de garrafadas que prometem curar as piores doenças. No entanto, a falta de grandes compromissos em manter uma devoção diária me faz viver dividida, num estado que eu chamaria de ceticismo religioso.
Movida pela curiosidade em comprovar aquilo que se vive na fé, fui em busca de uma figura antiga que personifica a crendice: o homem que, através de seus talentos espirituais, realiza feitos que o ceticismo não pode explicar. Soube de sua existência através de um amigo de um ex-namorado. Esse amigo, ao contrário de mim, demonstrava de forma incontestável suas crenças, contando histórias com sinais sobrenaturais e coincidências, no mínimo, curiosas.
Lembro-me de nós três apresentando claros sinais de descontentamento emocional, queixas tradicionais sobre problemas amorosos, financeiros, fechamentos de caminhos e quebrantos — tudo aquilo que os mais velhos usam para nos amedrontar. Apoiados nessas superstições, mantínhamos um dualismo entre problemas mentais, nossas próprias limitações, e possíveis amarras espirituais. No fundo, gostaríamos que fosse de fato um problema do mundo astral, pois isso nos isentaria da responsabilidade de nossos problemas e, ao mesmo tempo, comprovaria a existência daquilo em que tendíamos a querer (e também a não querer) acreditar.
Enfim, o dia chegou. Era um feriado no meio da semana, e, segundo as informações que esse amigo conseguiu, o senhor Vilázio atendia todos os dias, realizando rezas católicas e sem exigir dinheiro. Ótimo! Encontramos nossa experiência. Saímos após o almoço, sem calcular exatamente o que estaríamos fazendo, e fomos ao local de moto. Que péssima escolha... Pegamos a estrada em direção ao rezador. Segundo as orientações, deveríamos encontrar a entrada duas vezes após um posto de gasolina. E lá fomos nós, três desavisados, com motos questionáveis, por uma estrada de terra fofa e poças de água alternadas.
Hoje, lembro-me disso com ar de graça, mas a sensação de estar perdida em uma tarde, em um lugar desconhecido, foi aterrorizante. Lembro-me de ter que descer da moto diversas vezes para que meu ex pudesse atravessar poças de água e lama (a moto não ajudava, e a estrada, menos ainda). Finalmente, encontramos uma pessoa no meio daquelas estradas vazias (não era feriado? Onde estavam as pessoas? As pessoas geralmente vão para suas casas na roça). Que curioso... essa pessoa nunca tinha ouvido falar do tão conhecido rezador.
Após algumas tentativas frustradas de entrar em pequenos caminhos de terra, indo e voltando, eu já queria desistir. Meu pessimismo e conformismo eram muito fortes naquela época. O sol morno e as nuvens acinzentadas contribuíam para minha vontade de voltar à monotonia de minha casa. Ouvi dos dois um certo otimismo e insistência, e, sem meios para retornar sozinha, abracei a causa. Sugeri voltarmos para a estrada principal, pois nosso paradeiro não seria solucionado adentrando ainda mais aquelas estradas de terra.
Seguindo por uma certa distância, finalmente encontramos alguém que nos soube orientar com mais certeza, e descobrimos que estávamos bem longe daquele senhor. Por um momento, me questionei se ele realmente existia. Após mais alguns desvios, finalmente encontramos a entrada correta para o lar do rezador. Na euforia do achado, a moto, já muito quente, deixou uma cicatriz de queimadura em minha perna direita, presente até hoje.
Finalmente, encontramos o lugar, e que belo lugar! Não havia nada de especial, mas apresentava um simples planejamento em seu jardim. Uma pequena entrada, semelhante a um corredor de plantas, levava à frente da modesta casa. Todo o espaço estava repleto de plantas, baixas e altas, folhosas e floridas. Em frente à residência, havia um pequeno altar, singelo e muito bem cuidado, com uma imagem guardada por uma porta de vidro, que não pude identificar. Um detalhe com certeza não esquecerei, os cocos secos com cara de macaco, que curioso!
Ao chegar, vi sentada em um banco de madeira uma jovem moça morena, trajando roupas casuais, do tipo usado em academia. Notei em seu rosto cansado uma paciência que parecia ofuscar uma ansiedade que escapava pelo balançar dos pés e pelo movimento das mãos. Inicialmente, pensei que fosse alguém da família do senhor Vilázio. Ao lado dela, o senhor que estávamos aguardando conhecer. Trajava um casaco, calças longas, chinelos simples, e um chapéu, enquanto apoiava suas mãos desgastadas em uma bengala. Completo silêncio.
Ninguém dizia uma palavra; parecíamos três crianças que não sabiam o que estavam fazendo ali. Talvez por pena, o senhor tentava puxar conversa, falando sobre a vida, perguntando sobre nossos pais e, incrivelmente, conhecia as famílias de todos nós. No entanto, envergonhados, não dissemos uma palavra sobre o motivo de nossa visita. De repente, o telefone daquele senhor tocou. Era um homem de voz triste, pedindo conselhos sobre sua paixão. Aparentemente, a moça que ele desejava não correspondia... Seu Vilázio aconselhou o rapaz a seguir em frente, dizendo que os homens têm várias mulheres, e por que as mulheres não poderiam ter vários homens?
De repente, comecei a perder a sensação de paz que sentira ao chegar. Parecia que meus ombros estavam sendo pressionados para baixo, e eu já não queria mais ficar ali. Impaciente, o senhor nos perguntou de uma vez o que havíamos ido fazer ali. No impulso, respondemos que só queríamos vê-lo. Em resposta, ele disse: "Então já viram, podem ir embora." Ri internamente da minha dificuldade em ser direta.
Logo, meu amigo se expôs, dizendo que precisava de ajuda e queria conversar. E lá se foram horas de espera, sem sabermos como deveríamos agir. Nada era muito claro; havia a necessidade de trabalhar a paciência. Ele só atenderia se estivesse bem e no seu tempo, o que é totalmente correto. Porém, que jovem de 20 anos tem essa tolerância? Definitivamente, achei aquele momento de espera um exercício de paciência. Ninguém nos explicava como funcionava, e ninguém tinha coragem de perguntar. Por fim o senhor chamou a moça para ser atendida, e então entendi que ela também estava ali em busca de ajuda.
Após uma espera que parecia uma eternidade, meu amigo foi chamado, entrando na salinha de atendimentos, passando por uma pequena porta de madeira velha que impossibilitava ver qualquer coisa. Restaram apenas eu e meu ex-namorado (os atritos pessoais não ajudavam na espera). O local começou a escurecer, mesmo sendo ainda cedo, o que era estranho. Os passos e o vento não eram suficientes para abafar a sensação de silêncio que eu ouvia. E que peso eu sentia! Quanto mais eu esperava, mais queria ir embora, imaginando o que estava acontecendo naquela salinha.
Paralelamente, a esposa do rezador sofria. Não soube quais eram as causas de suas queixas, mas sabia que se tratava de uma doença. Ouvir seus lamentos de dor naquele momento tornava o ambiente ainda mais triste; não havia medo, mas sim uma profunda tristeza. Pessoas vinham e iam, e aquilo parecia eterno. Decidi não ser atendida. De repente, comecei a me sentir atormentada. Seria algo espiritual? Finalmente, meu amigo saiu! Mas eu não queria mais ficar ali. Juntos, os três saímos em direção ao corredor de plantas, sem dizer uma palavra.
O constrangimento, misturado com a sensação de tormento, não me fazia bem. O alívio veio automaticamente ao sair. Não vi e não vivi nada, mas, com certeza, esse encontro não será esquecido. Quanto dessa espera foi influenciada pela minha fértil imaginação e pelas energias presas naquele lugar? Talvez não espiritualmente, mas o senhor Vilázio me mostrou como um homem pode impactar as crenças de alguém... Quanto ao meu amigo: pálido, calado, com o olhar estático e distante. Seguiu em frente com sua moto. Houve uma tentativa de explicar sua experiência, porém falhou. Soube que teve revelações, receitas de banhos e até mesmo a visão do desaparecimento de algo... Enfim, estranho e impactado, me pergunto até hoje o que ele viu.
Atualizado em: Qua 30 Out 2024