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300 anos de Carnaval no Brasil

O Carnaval no Brasil está completando 300 anos em 2023. Os portugueses trouxeram a festa em 1723 e após adaptações com a mistura de instrumentos e ritmos africanos e até indígenas, surge no século XIX as primeiras manifestações similares aos blocos incluindo o confete e a serpentina. Vale lembrar que o Carnaval é uma festa que surge antes de Cristo em homenagem aos agradecimentos de boas colheitas. Foi no ano de 1855 que surgem os tradicionais blocos carnavalescos que dariam origem as escolas de samba aqui no Brasil.

Chama bastante a atenção a movimentação e a arrecadação tributária no Brasil antes e durante este período. Tributos são arrecadados em larga escala e empresas lucram, geram empregos e permitem as manutenções culturais, artísticas, a Memória e História do país. Neste sentido basta imaginar quantas pessoas são ocupadas e ganham pelo trabalho nas confecções de fantasias, carros alegóricos, blocos, estética pessoal. Nota-se que existe toda uma complexidade que envolvem serviços e industrias para o objetivo final que é o Carnaval.

Movimenta-se quase 5 bilhões de reais entre a preparação e o evento em si. Esta festa não envolve só a parte cenográfica havendo negócios de diversos tipos, ofertas de serviços e toda uma cadeia complexa empresarial que é negligenciada por grande parte dos contrários ao evento. Gera-se também uma unidade comunitária dentro das quadras de escolas de samba com serviços sociais onde o Estado muitas vezes não atende. A formação cidadã também passa pela escola de samba onde é possível aprender a tocar instrumentos, despertar para os estudos em diversas áreas do saber e ainda sociabilizar-se.

Trabalhos interessantes tem surgido através da Velha Guarda das escolas de samba. Elas passaram não só como guardiãs da história da agremiação carnavalesca como uma mantenedora da História dos bairros e comunidades, trazendo novas formas de saber e entender o passado e como chegamos ao presente. Fotos e documentos, informações diversas sobre Carnaval e comunidade estão guardadas ali. A oralidade também manifesta-se como saber e enriquece ainda mais o presente e novas pesquisas sobre o passado. Foi assim que após a desativação da quadra do Vai-Vai foram achados e mantidos vestígios do final do século XIX e início do XX na Bela Vista, explicando não só aquela época e toda uma nova construção de pensar sobre a cidade de São Paulo, hábitos e costumes.

Os sambas de enredo com suas letras são verdadeiras aulas. Estimular que sejam ouvidos é uma boa prática alimentando a pesquisa, o interesse pela História, descobertas biográficas e especialmente a participação cidadã e social visando mudanças. Particularmente, tenho o hábito e ouço muito sambas de enredo. Uma criança ou adolescente perceberá novas formas de pensar, analisar a História e suas práticas políticas atuais, ofertando críticas e soluções aos problemas presentes. Percebe-se que não é só uma festa que acaba em si sendo seu material de consulta atemporal e muitas vezes atual.

Deve-se lembrar que o Carnaval permite a realimentação da nossa identidade histórica, o aprendizado com o passado, a proposta de soluções de problemas que permanecem em nosso tempo como o racismo, o preconceito, a desigualdade social e valorização da vida de qualquer grupo étnico. Abre-se novas portas para estudos e pesquisas, forma e complementa a cidadania, estabelecendo uma permanente ligação passado/presente gerando complexos elos e raízes que o tempo atual tenta apagar pelo Capitalismo voraz e consumista. Neste sentido, o Carnaval é também período para reflexões sobre o tratamento que damos ao outro como ser humano.

É preciso dizer que há um forte folkmarketing dentro do Carnaval gerando perdas significativas em relação a sua essência. As tentativas de empurrar produtos fora de época ou que não estejam alinhados com o Carnaval raiz tem sido objeto de reflexões atuais. Eventos musicais com ritmos que não fazem menção ao samba, música típica do Carnaval, mostra que entramos numa nova era desta festividade onde importa atender aquilo que o povo quer e deseja ver o ouvir e não a preservação da estrutura genuína em si da festa. O importante é encher a cara, pular ao ritmo do som, pouco importando se é samba, rock, música de sofrência e etc. Esta descaracterização empobrece o evento e remodela uma tradição que está perdendo sua raiz étnico/cultural. Por outro lado, o Carnaval precisará lidar com este sincretismo para que não seja algo imóvel e engessado permitindo diversas expressões locais.

O retorno dos blocos de rua poderá incentivar o Carnaval de salão, os antigos bailes com marchinhas tradicionais que se perderam no tempo recente, atendendo aquilo que chamamos de politicamente correto. A readaptação de letras dará novo gás para voltarmos aos tempos antigos onde a produção musical era riquíssima e atendia aos diversos grupos musicais que enchiam salões e permitiam verdadeiras festas sociais com intensa alegria. Este resgate, dependerá muito mais das iniciativas privadas do que públicas. Perdemos nas últimas décadas um mercado carnavalesco valioso que necessita de investimentos e diálogo com a sociedade. Este ato de apagar os salões permitiu um empobrecimento do Carnaval em favor do folkmarketing. Tomara que os bailes de salões voltem. Eu sinto falta e você?

Vander Roberto é Analista de Sistemas e Especialista em Engenharia de Software com MBE. Atualmente faz Especializações em História Afro/Indígena e Segurança Cibernética.
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Atualizado em: Qui 9 Fev 2023

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