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O COLECIONADOR DE FAVAS

Ele coleciona favas. Isso mesmo, favas, aquelas sementes que o mar traz à praia, e sabe-se lá de onde vêm. Caminhar na praia e procurar favas é algo que lhe dá muito prazer. Gosta do barulho do mar, da brisa constante, dos pássaros, do contato dos pés com a areia. Acha tudo muito bom de ver e sentir. Cada fava encontrada é admirada e guardada com muito carinho, mas nunca antes de ficar um pouco em suas mãos. Ele acha que elas possuem uma energia especial e adora senti-las. Às vezes, quando está na praia procurando favas, fecha os olhos e respira fundo, e uma onda imensa de prazer inunda o seu corpo. Quando está procurando favas ele esquece de tudo, parece que o tempo não existe e seu mundo se resume àquele momento. Pode parecer esquisito, mas este colecionador diz que as favas são irmãs umas das outras e por esta razão entende que elas devem permanecer juntas. Na sua casa ele as guarda num pote de vidro,que é substituído por outro maior toda vez que as “irmãs” já não cabem ali. Sabe de uma coisa? Ele me contou que cada fava recolhida representa um sonho e olhe que já são muitas. Posso assegurar que todos são muito bons e se um dia se concretizarem nós viveremos num mundo melhor... Certo dia, quando segurou uma fava que acabara de achar, uma energia intensa o paralisou; uma luz intensa irradiava da sua mão e num piscar de olhos ele fez uma viagem incrível. Sem saber se era sonho ou realidade, o colecionador de favas viu e sentiu o que jamais imaginou e teve a certeza de que sua vida não seria mais a mesma. O tempo e o lugar eram desconhecidos, por toda parte haviam partículas parecidas com filamentos que vibravam com intensidades diferentes, se unindo e expandindo, formando uma espécie de membrana onde outras partículas em forma de anéis surgiam e desapareciam, aqui e acolá, numa dança enigmática que desafiava todas as Leis da física. Passado o espanto inicial daquela visão, ele percebeu que infinitas membranas flutuavam paralelamente, cada qual com suas formas e características diferentes. De onde estava, pôde ver a praia onde caminhava e recolhia suas favas, só que ele não estava lá. Viu uma infinidade de “bolhas”, todas elas cheias do “todo” e do “nada”. A sensação de que vagara entre mundos e dimensões desconhecidas o inebriou e quando se deu conta, olhava fixamente para uma fava. Foi então que ele descobriu que nós humanos somos insignificantes diante da imensidão do universo (ou universos - já ouviram falar da Teoria “M”?); soube que tanto a fava que tinha nas mãos como tudo que há no universo é formado pela mesma matéria; compreendeu que a ciência já respondeu importantes questões e vem derrubando mitos, mas ainda há muito a ser esclarecido; percebeu que o mundo em que vivemos não é melhor por conta das fraquezas humanas; constatou que as crenças místicas e religiosas, que inundam as cabeças da maioria das pessoas, são piores que as doenças mais mortais, pois dizimam a nossa espécie desde a época em que começamos a andar (já pararam para pensar quantas guerras insanas existiram e existem, onde se mata e morre em nome de um Deus?);entendeu que é preciso parar de perpetuar “lavagens cerebrais” em nossas crianças, sem deixar que elas pensem, reflitam e tirem suas próprias conclusões - vamos mostrar-lhes um lindo jardim e apenas dizer-lhes que é belo porque é colorido, porque é calmo, cheiroso, porque existe uma infinidade de vidas ali que nos mostram todo o esplendor da natureza, e não porque fadas; duendes ou criadores oniscientes e onipotentes são os responsáveis por tudo aquilo. Então ele sonhou mais uma vez: ele olhou para o futuro e viu uma espécie humana livre de crendices medievais; viu crianças crescerem livres e iguais, sem distinções incompreensíveis impostas por adultos que apenas repetem o erro de que também foram vítimas; viu um mundo mais justo; sem as guerras pestilentas e os massacres em nome de seres imaginários; viu um mundo sem preconceitos, sem divisões raciais e étnicas, enfim, sonhou com um mundo melhor.
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Atualizado em: Qua 4 Jan 2023

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