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Fênix - Parte XIV
Era madrugada, o vento soprava gélido lá fora. A lua não brilhava no céu, apenas a escuridão pairava sobre nós.
Eu estava sentada na beira da cama, aos pés de Fernando, olhando-o dormir. Ele me parecia calmo e eu estava feliz por não vê-lo se contorcendo de dor, como já era de costume. Mas, um sentimento estranho, algo parecido com um mau presságio, cortou o meu corpo fazendo-me arrepiar. Imaginei que este arrepio tivesse sido causado pelo fato da janela estar entreaberta ou que fosse apenas o reflexo da solidão que eu sentia naquela imensa casa vazia.
Sacudi a cabeça como que para afastar meus pensamentos, entretanto, lá estavam eles martelando no mesmo lugar.
Um novo arrepio se formou em minha nuca e espalhou-se como uma onda pelo resto do corpo. Levantei e caminhei devagar até a janela, inspirei pela última vez aquele suave sopro da noite e fechei-a em seguida.
Pus-me em movimento para posicionar-me novamente em meu lugar. Porém, meus passos foram interrompidos no meio do caminho.
Fernando tentou levantar-se sem sucesso. De repente, começou a puxar o ar com mais e mais força, como se alguma coisa estivesse sufocando-o. Aproximei-me da cama e acendi o abajur na mesinha de cabeceira.
Ajudei Fernando a se sentar e, rapidamente, sua camisa branca de algodão ficou ensopada de sangue.
Entrei em desespero.
Respirei fundo e lembrei-me de um curso de primeiros socorros que havia feito no Rio Grande do Sul antes de assumir o cargo de professora.
Inclinei-o para frente, apertei suas narinas e incentivei-o a respirar pela boca, enquanto eu sacava meu celular no bolso da calça jeans desbotada que eu usava e liguei para o 192.
Pensei em tentar ajudá-lo a se levantar e andar até o carro, mas Fernando estava fraco demais para sustentar seu próprio peso. Ele estava ainda mais frágil e pálido, por causa da perda de sangue, me fazendo ter a impressão de que ele desmaiaria a qualquer momento. Então, eu não tinha outra opção a não ser esperar.
Meu desespero aumentava a cada minuto que passava e eu torcia para que o socorro chegasse logo.
A maca apressada atravessava os corredores do mesmo hospital em que Fernando estivera tempo atrás, enquanto eu dava seus dados para o prontuário.
Ainda sentia a agitação que se instalara dentro de mim desde que Fernando passara mal e sentia-me frustrada por não poder estar em seu encalço. Era assustador demais estar ali sabendo que ele não estava bem e eu nada podia fazer apesar de querer estar junto dele, segurando sua mão. Eu morria de medo de que ele partisse sem me ter por perto.
Assim que a atendente concluiu o prontuário, parti em disparada para o quarto que eu havia conhecido semanas antes.
Abri a porta com cuidado verificando se eu poderia entrar quando um médico me avistou e fez sinal para que eu fosse até ele.
— E aí, doutor? Como ele está? – Perguntei ansiosa.
— Estável. – Ele respondeu sem ânimo algum.
— O que o senhor quer dizer com “estável”? – Eu precisava saber, exatamente, pelo que esperar.
— Bem, a senhora sabe que ele tem uma doença grave e que está em fase terminal. – Ele deu uma pausa como se escolhesse as palavras. – Neste instante seu quadro está estável, mas não sabemos por quanto tempo ele vai agüentar. Sinto muito... – Ele acariciou meus cabelos, enquanto meus olhos enchiam-se d’água e eu os mantinha fixos em Fernando.
— Não! Ele não pode me deixar! Fernando! Fica, meu amor! Você não pode partir! Eu estou grávida, Fernando! – Eu implorava em meio às lágrimas.
— Shhhh... – Disse o médico abraçando-me.
Eu soluçava ainda envolvida em seu abraço, sem conseguir deter as lágrimas.
— Ele não pode fazer isso comigo, estamos esperando um bebê! – Eu quase gritei.
— Se acalma! Isso não vai fazer bem para a criança! – O médico disse preocupado. – Ele sabe da sua gravidez?
— Não! Eu descobri hoje, mas não deu nem tempo de contar. – Eu sentia-me desolada.
— Não fique assim! Vamos deixá-lo descansar e quando ele acordar você conta a novidade. – Desta vez ele falou mais animado.
— De que adiantará? Ou pior. Se ele não acordar? – Desesperei-me novamente.
— Não se preocupe! Ele vai acordar e, sinceramente, acho que essa notícia dará forças a ele para continuar lutando. Você quer ter mais algum tempo com ele, não quer?
— É claro que eu quero. – Eu disse passando a mão no rosto para enxugar as lágrimas. – Você acha mesmo que ajudará?
— Eu não acho. – Deu-se uma pausa. – Tenho certeza! – Ele riu dando uma piscadela para mim, depois se virou para ir embora. – Ah! Acho melhor você descansar. Creio que queira cuidar bem de seu filhinho...
— Doutor! – Chamei-o. Ele olhou-me. – Obrigada. – Eu disse mais calma antes dele partir.
— Por nada. Afinal, você nem deve me agradecer. Pois, eu não falei nada para te agradar!