person_outline



search

Mamãe nas tias

Com a escola em casa, das memórias, minha primeira professora, minha mãe, é a marca mais forte. Com apenas 5 anos, morava com meus pais na casa de minha avó. Mamãe era professora, mas como tantas outras, após se casar, interrompeu seu trabalho e seus estudos. Parece que fui seu veio dourado, seu público cativo, sua escolinha de um aluno só. Na verdade, éramos três: meu irmão mais velho, eu e mamãe. Papai comprou dois livros grossos da Turma da Mônica, um de Matemática e outro de Português. Aprendi a escrever com ۞s (estrelas), a contar estrelas, bolas e balões no livro de Matemática e a bordar palavras com letra tremida em lacunas repetitivas. Aí, ficava esperando aquele símbolo "¢" (Certo), que só depois de muitos e muitos anos fiquei sabendo que significava a abreviatura da palavra "certo".

Fiquei muitos anos procurando esse "cezinho" nos olhos de outras mestras e por vezes, o encontrei; elogios, incentivos, muitas vitórias. Parece que vejo essa letrinha nas mãos de minha amada namorada, ela falando e vários "cezinhos" se multiplicando em mim. Vejo um mundo que se cria através de sua reescrita, que começou com um verdadeiro gesto de amor, solidariedade, dedicação e carinho, com um ato materno.

Saber de onde veio essa vontade inicial de preencher vazios de finas placas "celulóidicas" com bordados aportuguesados justifica minha obstinação no campo, na várzea e na floresta das Letras. Reconhecer que o menino levado deixava-se levar pelas ondas coloridas de azul borrado no grosso livro educativo e que depois dizia: é azul mamãe! É azul! E ver e adorar aquela outra letra, a última, o "z", como se eu tivesse o poder de conter toda a criação alfabética, do "a" ao "z", e adorar ver o Tarzan, escrito com "z", correr na savana, do "v", pertinho do "z", atrás das zebras; porque "z" é zebra, mesmo que outra tia dissesse que o "z" era do zumbido das "zabelhas". Minhas tias, minhas "fessoras", minhas mestras, são minha mãe diluída em infinitos copos de groselha, com "s".

Ela, a dona do meu "A", ah... dizia: - Não é azul filho! É azul piscina. - Posso nadar, então, nesse azul mamãe?! Como ela não mais está aqui, e como ela é também a dona do meu "Z", um dia há de me dizer... É azul sim filho, sempre foi azul.

Pin It
Atualizado em: Dom 26 Out 2008

Deixe seu comentário
É preciso estar "logado".

Curtir no Facebook

Autores.com.br
Curitiba - PR

webmaster@number1.com.br