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O pedido de Casamento

Cinco minutos após o combinado, ele apareceu.
Esbaforido, foi logo entrando na relojoaria, louco para recuperar seus ponteiros tão preciosos. Eu, ali, narigão enfiado na vitrine, apreciava clássicos Casios e torcia as sobrancelhas diante de Champions coloridos além do necessário.
Numa ponta, quase oculto, um mostruário de anéis e alianças reluzia seus encantos diante do meu olhar sonhador. De repente, me peguei sendo agraciado com o número dois, imaginando que aquele modelo ficaria lindo no meu dedão gorducho.
“Vamos?”, ele cantarolou em meu ouvido esquerdo, todo-todo por agasalhar novamente seu pulso tatuado com a modernosa joia prateada.
“Antes de lancharmos, poderíamos dar um pulinho na Matriz?”, seu sorriso de pérolas lindamente alinhadas imantava nosso caminhar.
Encantado, eu nada repliquei, apenas segui meu companheiro até o monumento sagrado. Naquela hora da tarde, véspera de feriado, não havia ninguém no interior do Silêncio. Em respeito e fé, posicionamos nossos corpos eletrificados na segunda fileira de bancos reluzentes. Encarando um Cristo piedoso, engatamos preces de gratidão – cada um à sua maneira – mantendo uma inexplicável coincidência de sensações e desejos.
Eu, de olhos bem fechados, debulhei em lágrimas na alma durante o bate-papo com o Criador, elevando com humildade meu mais puro agradecimento por ter finalmente encontrado minha Alma Companheira. Ele, de olhar vitrificado a encarar o semblante do Filho, de repente tomou coragem e liberdade de procurar minha mão marmórea que acarinhava bem de leve sua coxa sedosa. Diante da Trindade, mareados numa inexplicável emoção a alfinetar nossos corações em soluços, quem poderia apostar imaginarmos – numa sincronia absurda! – o casamento dos nossos espíritos afins?
Nada mais importava naquele instante mágico. Ignorávamos se porventura uma multidão adentrasse o recinto aqui e agora. Ninguém conseguiria roubar nosso momento de união suprema. Queríamos fortalecer a mesma promessa, mas não tivemos coragem ou encontramos o jeito ideal de pronunciar as frases certeiras.
Já em casa, eu dava os últimos retoques no jantar enquanto ele escolhia o que iríamos beber. Nenhuma palavra fora do trivial foi revelada. Depois da louça lavada, ele me convidou para um filme com nossa fofa preferida. Kristen Stewart encantava em mais um papel marcante, quando sem mais, nem menos, o longa foi pausado e um beijo foi roubado.
Entre lágrimas e soluços, ele tomou meu rosto atarantado entre suas mãos decididas, onde seu olhar de jade balbuciou o que eu tanto queria ouvir. Porém, eu jamais poderia imaginar que o momento exato seria materializado bem ali, naquela sala carregada de expectativas.
Enquanto orávamos e agradecíamos, eu não tive coragem de lhe pedir em... você quer... será que você aceitaria..., ele se envolvia num vendaval de dúvidas e medos salpicado de anseios. Eu aceito. Eu sempre soube que eu era o Escolhido.
“Sim, eu quero me casar com você!”, devolvi minha última decisão com o mais fantástico dos beijos.
Esquecemos o filme e em abraços elásticos, murmuramos nossas alegrias e aceitamos nosso destino. Enfim, entre estalos deliciosamente indiscretos das línguas besuntadas em nossas lágrimas agridoces, descobrimos que nosso caso do acaso estava muito bem marcado naquela terceira carta do Tarô.
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Atualizado em: Qua 12 Abr 2023

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