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A Mitologia de Ekhaya - Livro 6: A Floresta de Thalwynn
Ah, Thalwynn… Ainda posso sentir o gosto de sua névoa em meus lábios e o som de suas folhas sussurrando segredos antigos. Vocês, filhos do presente, podem chamar-lhe de floresta, mas para mim, Thalwynn é mais do que um emaranhado de troncos e raízes. Ela é a canção das primeiras lágrimas de Nammu, o eco de um tempo em que os sonhos ainda não temiam as sombras.
Vi suas árvores erguerem-se do solo como se despertassem de um longo sono, cada uma nascida de uma emoção esquecida, de um desejo não realizado. Elas não apenas vivem — elas lembram. Lembram de vozes que se perderam, de risadas que um dia ecoaram sob suas copas, de passos de Andarilhos que ousaram atravessar seus domínios sem compreender que estavam pisando em memórias vivas. Algumas dessas lembranças são suaves, como a brisa que dança entre as folhas; outras… bem, outras são tempestades que devoram aqueles tolos o suficiente para tocar uma árvore sem permissão.
Mas Thalwynn não é apenas um refúgio de sonhos. Ela pulsa com vida em formas que vocês jamais poderiam imaginar. Seus habitantes não são meros animais — são fragmentos da própria essência dos sonhos. Já vi cervos cujos galhos de cristal captam a luz da lua como um espelho d’água, pássaros que carregam constelações inteiras em suas asas, e felinos que deslizam entre sombras como se nunca tivessem pertencido a este mundo. Há beleza, sim… mas também perigo. Pois quando o equilíbrio se quebra, essas criaturas, antes graciosas, tornam-se pesadelos.
No coração de Thalwynn repousa um lago que não reflete corpos, mas almas. Já parei diante dele muitas vezes e encarei o que sou — não apenas Mira, mas todas as forças que me moldaram. Não recomendo essa experiência a qualquer um. Há verdades que queimam mais do que o fogo, e algumas almas, frágeis como folhas secas, se estilhaçam ao encará-las.
E há algo ainda mais curioso sobre essa floresta… seu tempo não é como o nosso. Caminhei por trilhas que pareciam durar uma eternidade e, quando saí, apenas alguns instantes haviam passado. Outras vezes, um simples piscar de olhos me roubou dias. Thalwynn não segue os caprichos das horas — ela se dobra ao fluxo dos sonhos, e os sonhos nunca foram feitos para serem contidos.
Entre os antigos, ainda corre uma lenda sobre uma Andarilha sem nome. Ela partiu sozinha, buscando um segredo enterrado nas entranhas da floresta. Nenhum rastro ficou para trás. Alguns acreditam que a floresta a consumiu, que seu espírito se dissolveu entre as raízes e galhos de Thalwynn. Outros dizem que ela nunca se perdeu — apenas se tornou algo maior, invisível aos olhos impacientes dos mortais. Às vezes, quando os ventos dançam entre as árvores e as folhas murmuram em vozes esquecidas, sei que é ela. E sorrio.
Porque Thalwynn não é apenas uma floresta. Ela é uma lembrança viva, um guardião sem rosto, um espelho do que fomos e do que ainda podemos ser. E aqueles que ousam entrar em seu domínio devem se lembrar de uma coisa: Thalwynn não esquece.
Ela nunca esquece.
O Sussurro de Thalwynn (Narrado por Mira, a Guardiã da Vida Selvagem)
Atualizado em: Sex 14 Fev 2025