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Do lixo ao luxo na Cidade da Baía de Todos os Santos
A cidade bela e faceira com as suas belezas naturais e seu povo fazem um lugar melhor para se viver. Assim é a cidade soteropolitana. Quem passa pelas festas de “São Salvador” e, principalmente, pelo carnaval, não esquece. Um carnaval cheio de contrastes. Das belas mulheres de Iansã e Yemanjá, que encantam com a sua poética dança e seu sorriso encantador, aos homens espadaúdos dos trabalhos braçais ou das academias, galanteadores maliciosos, muitas vezes, vulgares, de plantão da cidade baiana, aos seus outros moradores, não tão privilegiados, mas, que a fazem única. A diversidade cultural dessa festa é algo que impressiona quem escolhe desembarcar em Salvador. A festa do povo, a festa da multidão, a festa da coletividade, onde todos os ritmos se misturam, todas as cores se multiplicam e todas as divisões de classes se ampliam e engrandecem.
Nos camarotes, somente em alguns, todos param. O público olha curioso para os seus deuses da beleza e da notoriedade. E admiram, imobilizam-se, gritam, choram e pedem por um aceno de seus admirados artistas e as celebridades do momento. Às vezes, saem saciados crendo que realmente o carnaval valeu à pena. Beijos, amassos, namoricos são ingredientes fundamentais para esses foliões incansáveis e insaciáveis por adrenalina. Pois, música é adrenalina, carnaval é adrenalina, adrenalina é curtir até os últimos minutos e como diz o poeta cantor Caetano Veloso em seus versos, “atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu ..."
Dizem que, na Bahia, o inusitado pode acontecer. Imagine a situação!! Durante o carnaval, a grande maioria das pessoas solta as suas feras e fantasias e se divertem percorrendo as ruas da cidade, e de repente vem um bloco Evangélico para evangelizar os foliões. Isso mesmo, o bloco chamando chamado, Sal da Terra, da Igreja Batista Missionária da Independência (IBMI). Eles desfilam de 20 a 24 de fevereiro, das 15h ás 23h, no circuito Batatinha (Pelourinho e Praça da Sé), com apresentação de danças e dramas, banda de percussão, roda de capoeira, evangelização de crianças com palhaços, brincadeiras e vários bonecos, cantores gospel, a exemplo de Marinez, ex-Banda Reflexus, evangelismo pessoal, apresentação circense e distribuição de folhetos. A intenção é resgatar as pessoas das drogas e fazer as pessoas conhecer o evangelho. Traduzindo assim a diversidade que é o carnaval soteropolitano.
Carnaval é multiplicidade do “que é que a Bahia tem”. È o catador de materiais recicláveis catando para seu sustento, do vendedor de caixa de isopor levando um dinheiro para casa, do produtor ao repórter e este para a direção das TVs, rádios e jornais trabalhando em prol de uma nova notícia para o seu público. Dos cantores e produtores do estado envolvidos nesse grandioso evento, principalmente o povo. E, não é só festa. É muito trabalho, organização e profissionalismo. Afinal, manter com segurança quase três milhões de pessoas circulando pela cidade, não é fácil.
É uma festividade esperada com grande ansiedade durante todo o ano. Contudo, está perdendo o seu fio condutor que é a participação popular. Camarotes e blocos, cada vez mais, ocupam o lugar dos foliões. Não há mais espaço para as pessoas brincarem, se divertirem e marcar ponto de encontro, como antigamente. Os trios elétricos independentes perdem apoio por falta de patrocínio. Blocos afros e outros tradicionais, que fizeram a história do nosso carnaval, perdem espaço e dinheiro, pois desfilar nos circuitos é muito caro e requer certa reserva de dinheiro. Grupos como Muzenza, Male-de-bale, Apache e alguns outros sofrem, em virtude dessa valorização exacerbada do que é feito para vender e consumir.
Do lixo ao luxo de Salvador. Do lixo que é deixado na cidade durante o período da folia ao luxo dos majestosos camarotes. Pode-ser ver a diferença social muito forte nesses dias de folia. Entre os catadores de materiais recicláveis que se espremem, caem, se atiram para pegar os materiais na folia, para ser mais rápido que seu concorrente, aos cordeiros que ficam entre um lado e outro, mas, segurando a corda. Contendo, toda aquela multidão, formando um paredão humano em virtude da segurança dos foliões dos blocos que pagam para brincar com mais segurança. E ainda, não recebem como deveriam, muitas vezes, ficam até meses sem receber pelo trabalho que fizeram. O carnaval tem dessas coisas!!!!
Carnaval – suas origens
Alguns registros denominam a origem do carnaval no latim medieval dos séculos XI e XII, cujo significado é Carmem levare ou carnelevarium. Abstinência pelos católicos de comerem carne, durante os quarenta dias, após a quarta-feira de cinzas. Outros dizem, que seriam uma festa pagã que celebrava o inicio do Ano Novo e o ressurgimento da natureza. Estudos indicam que as primeiras manifestações do carnaval de hoje, talvez, estejam ligados a influência da Roma dos Casares, ligadas as famosas saturnálias de caráter orgíaca. Elas trazia referência à Dionísio, uma das formas do Rei Momo, deus do Baco, patrono do vinho e de seu cultivo que festejavam uma alegria estonteante e as alegrias referente a vida e conseqüentemente uma comemoração da vida
Segundo, Dr.Hiram Aráujo, o Centro de Excelência do Carnaval localiza-se na Grécia e em Roma, entre o século VII a.C. e VI d.C.. Com as sociedades já organizadas em castas e rígidas hierarquias, com a nobreza, o campesinato e os escravos, nitidamente separados por classes acentuam-se as libertinagens e licenciosidades, provocadas, ao que se supõem, pela necessidade de válvulas de escape (era o culto ao corpo sem culpa da filosofia escolástica). Sexo, bebidas e orgias incorporam-se, definitivamente, às festas que, juntamente com o elemento processional e a inversão de classes, compõem o modelo que alguns autores consideram o fulcro estético e etimológico do carnaval.
O carnaval de Salvador não é mais, o mesmo. A beleza de antes, dessa festa popular, está ameaçada por seus belos camarotes e pela ganância dos grandes empresários que usam o marketing de seus produtos nas grandes vitrines dos famosos e concorridos camarotes, em que a platéia assiste sobre suas cabeças e as câmeras captam seus melhores momentos. Um “Coliseu” a céu aberto sepulcrando a beleza da festa. Ricos versus pobres demarcando bem o seu status social, ou seja, “o pão e circo” e você esquece tudo que vive na vida real.
E assim, nascia o carnaval. Depois, de anos e décadas de criação, a festa, incorporou e e adequou a sua filosofia nas sociedades de cada época. Hoje, segundo a lógica do carnaval pregado entre as pessoas, a festa representa o carnaval dos antigos. Onde ninguém é de ninguém. Só diversão, alegria, paqueras, sexo e fetichismo em que cada pessoa, a sua maneira, coloca a sua mascara e representa seu fetiche, em que tudo é permitido. As pessoas ficam cegas com as luzes do trio elétrico e eufórica com seus sons estremecedores e adrenalínico. Uma hipnose coletiva acontece e todos, ou quase todos, ficam num estado de embriagues de sons, ritmos, suores, bebidas, corpos incandescentes que se roçam entre si, bocas sedentas de desejo. E depois de setes dias de puro “deleite”, a vida surreal do carnaval termina e todos voltam para suas casas e trabalhos, a viver o mundo real. A viver no tempo presente nu e cru, com todas as suas dificuldades, diferenças sociais e de gêneros que o carnaval agrupa e que se interagem entre si.