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Têm sereias na região...

Numa época que falar em democracia era proibido, eu, e um amigo saímos para um feriado de liberdade e aventuras. Depois de duas horas e meia de estrada, chegamos ao nosso destino. Paramos o carro no acostamento, a beira da estrada de terra que nos levava ao paraíso. Fora do carro! Esticamos as pernas e fomos agraciados pela brisa.  Ah! O ar puro do mar. Daquele ponto do morro avistava-se um belo cenário. Uma enorme pedra, á esquerda, de onde muitos disseram ter avistados discos voadores. Lisa de tanto ser surrada pelas ondas que batiam com tanta força, que sua espuma subia nas alturas, e outra a direita, formando um aglomerado de muitas pedras, sobrepostas. Formando algumas pequenas cavernas. Espetáculo da natureza inigualável; a praia rodeada por uma vegetação formada por pequenas árvores. Duas casas, uma que era nossodestino, e outra, cujos moradores eu não conhecia. Daquela altura eram tão pequenas, edelineavam o cinturão verde que separava a praia da estrada. Voltamos para o carro, eu e meu amigo João, e iniciamos a descida. Estrada ruim. Uma ribanceira, como se diz no verbo popular, até chegar à praia. Estacionamos no terreno da casa do tio Rene. Caiçara que eu conhecia já de outros verões. Baixinho de barba rala, magro, com seus setenta anos de idade; e contador de estórias incríveis. Mais de meia dúzia de filhos, mas nenhum deles quis saber da profissão do pai. Todos foram embora. Ele, pescador talentoso que com sua canoa durante toda a sua vida, tirara do mar o sustento de todos, havia ficado só. Sua esposa já havia falecido.

 Deu-me um forte abraço. Apresentei meu amigo. E perguntei: têm visto discos voadores por aqui? Só sereias, respondeu: Demos risada. Entre as muitas estórias vividas no mar, que incluía Óvnis, ele afirmava ter visto por várias vezes, sereias em suas pescarias.  É verdade seu Rene, perguntou João? Ele retrucou: juro que sim, por Deus e pelos meus pais, que já se foram dessa para melhor.

Armamos a barraca, no terreno, ao lado da casa, tiramos nossas coisas do carro, e fomos tomar banho de mar. Tibum! Que água gostosa. João que estava vindo pela primeira vez saiu rápido d’água para explorar as redondezas. Como ele demorava demais para voltar, também sai, e comecei a procurá-lo. Lá estava ele, há uns quinhentos metros na direção daquele amontoado de pedras. Quando me viu, pediu silêncio. Cheguei de mansinho. Ele estava eufórico. Disse ter visto em cima da formação rochosa à direita, mulheres nuas. Sorri e disse: você está vendo miragens. Não vejo nada além de pedras e mar. Ficamos ali quietos por um bom tempo, e nada. De repente tive a impressão de ouvir um canto feminino, era bonito e vinha daquela direção indicada. Guardei a sensação comigo. Mas, não se via nada. Essa praia era pequena, e diferente, a vegetação ficava bem próxima da areia, e do mar. Por isso era possível ficar de tocaia. Mas o tempo foi passando e nada das mulheres supostamente vista pelo meu amigo. E, podíamos ter confundido o som. A imaginação humana não tem limites.

 Procuramos o Tio Rene e relatamos o acontecido. Eu sabia, afirmou ele. Lá é a pedra onde as sereias descansam, e tomam sol. Amanhã sairemos para pescar e, quem sabe surpreenderemos uma delas.

 O dia passou rápido. Havia poucos campistas por ali. Conversamos com um casal, acostumados com a região e suas estórias. Disseram; causos de pescadores com certeza.

Anoiteceu!  Resolvemos acender uma fogueira em frente casa do Tio Rene. Outras pessoas juntaram-se a nós. Conversa vai, e conversa vem. Ele se sentou com a gente e voltou a afirmar que nesta região, sereias apareciam mais que disco voador. Assamos, comemos peixes, e bebemos. Olhamos para um céu repleto de estrelas. Acredito que todas as constelações estavam visíveis; via-se até estrelas cadentes, mas nada de OVINIS, e, muito menos, o canto de sereias.

Na manhã seguinte acordei meio tarde.  João e Tio Rene, como haviam combinado, foram pescar. Sai para dar umas voltas na praia, e inconscientemente, fui parar perto do rochedo. Fiquei meio de longe, mas cheio de curiosidade. Era aproximadamente onze horas da manhã, e o sol estava bem quente. Pensei. Vai que as sereias apareçam! Neste instante, ouvi o que parecia ser uma voz feminina. Tive a impressão que uma mulher apareceu entre as rochas e desapareceu rapidamente. Fiquei esperando mais alguma coisa, o que não aconteceu. Será alucinação por causa das estórias, refleti.  Não demorou muito, outra apareceu. Não era alucinação! Eram duas mulheres. Apareciam, e se escondiam nas fendas das rochas. Estavam rindo e nuas. Desapareceram como num passe de mágica. Em seguida ouvi um ronco de motor de lancha, que ia se distanciando... Provavelmente estava ancorada no lado da face do rochedo que dava para o mar, escondida. De onde eu estava não dava visão. O rochedo era alto. Então se fez silêncio; só se ouvia o barulho das ondas batendo nas rochas. As sereias sumiram... Ri, e pensei. Não é que Tio Rene tinha razão!

  Após o meio dia, voltei para o camping, e lá estava meu amigo, e o Tio Rene. A pescaria fora boa. Limpavam peixes. O jantar daquele dia, e o almoço do dia seguinte estavam garantidos. João entusiasmado disse que morreu de medo no começo, e que pescar de canoa era perigoso, mas que tinha sido valido pela adrenalina. Frustrado ele disse; pena não ter aparecido nenhuma sereia.  Com ar de autoridade no assunto, afirmei, mas elas existem! Vocês apenas não tiveram sorte hoje. Não estou te entendo disse João. Até ontem você não acreditava... Contei o acontecido... Rapaz de sorte exclamou Tio Rene.

  E, depois deste flash, deduzi; ou fugiram de lancha, ou se assustaram com o barulho do motor, e mergulharam para o fundo do oceano.

Com o rosto sério eu disse: Tio Rene, a partir de agora acredito em suas estórias! Soltei uma gargalhada. Eles me olharam, com aquele ar de quem não entenderam nada...

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Atualizado em: Seg 28 Abr 2014

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