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Estresse pós-traumático

    Quando se trabalha em um hospital psiquiátrico, ou como preferem dizer, um manicômio, ouve-se todo tipo de histórias, desde conversas simples sobre ter fobia de unhas até desventuras com seres extraterrestres. Mas o caso que irei contar com toda certeza foi o mais bizarro que já me ocorreu em todos esses anos de trabalho.
   Em dezembro de 1918 ele, o paciente número 119, foi internado em meu hospital, como de costume verifiquei a ficha do paciente, "Ernesto Silveira, 23 anos ", fora convocado para a grande guerra e adquirido a condição de stress pós traumático, como a maioria dos sobreviventes, nos primeiros meses o paciente não apresentava nenhum sinal de agressividade, apenas não conseguia se comunicar. Após um certo tempo de tratamento, foi conseguindo interagir com os enfermeiros e aos poucos voltando à lucidez, diziam. 
   Em Janeiro de 1920, após um ano de tratamento, o paciente conseguia conversar normalmente, retraído, mas ainda assim, normalmente. Antes de poder dar sua alta resolvi entrevistá-lo para fins de estudo com pacientes veteranos de guerra.
    Bateu em minha porta como designara os enfermeiros.
    " Olá doutor" 
    " Por favor sente-se senhor Ernesto, fico muito feliz em ver sua melhora, e que aceitou fazer esta entrevista"
    " Eu agradeço todo tratamento, mas não sei se posso voltar às ruas..."
    " Por que não poderia?" Questionei surpreso 
     " Tem algo muito errado comigo, doutor"
     " O que exatamente está errado em você?"
     " você não acreditaria..." 
 Seu semblante havia mudado para o de alguém que estava sendo vigiado, olhava rapidamente para todos os lados mas nunca parava o olhar em alguma superfície que refletisse seu rosto.
     " podemos tentar pelo começo"  
     " não foi só a guerra... em certo momento após já estar no campo de batalha há alguns meses, eu fui enviado para seguir uma trilha deixada por alemães, fui enviado sozinho pois já tínhamos tido muitas baixas e eu era o mais esguio, poderia segui-los descobrir a localização e voltar ao acampamento para informar ao comandante. Mas o que realmente aconteceu foi que após algumas horas na trilha dei me de cara com um rifle apontado em minha direção, rapidamente posicionei meu rifle na mira do soldado alemão porém no momento disparo, minha arma travou, por coincidência do destinos a dele também, ele veio em minha direção com força, após trocamos alguns socos e empurrões o soldado alemão percebeu o quão assustado eu estava, apenas tentava me defender de seus golpes, então parou seu avanço contra mim e sentou-se ao meu lado, estava tão ofegante quanto eu. Após alguns segundos parados ele se levantou e estendeu sua mão para mim, apertamos as mãos e seguimos em direção ao acampamento que eu buscava antes, o soldado alemão tentou me explicar por meio de sinais que havia apenas ele instalado nesse acampamento, o que me deixou tranquilizado o suficiente para acompanhá-lo até lá.
    Após chegarmos ao acampamento, o alemão me forneceu comida e bebida, aceitei com certo receio, mas sentia que não tinha mais nada a perder, se ele fosse me matar ja teria o feito enquanto estava distraído. A adrenalina havia diminuído e o cansaço bateu com força, sentei próximo a uma árvore e dormi, lembro-me que no sonho eu acordava sem poder me mover, na minha frente estava o soldado alemão com um olhar perverso, ele vinha até mim e me desmembrava aos poucos me mantendo vivo, eu podia ver meus braços e pernas pendurados nas árvores mas não podia me mover nem gritar.
    Acordei desesperado com o som de uma bomba explodindo não muito distante, o soldado alemão estava acordado em volta de uma fogueira, com uma expressão de cansaço, provavelmente não dormira com medo que alguma tropa aliada viesse a minha procura. Um fato em especifico me fez despertar de vez do meu pós sono, notei que o homem à minha frente não possuía a perna esquerda, estava com uma muleta improvisada ao seu lado, o ferimento não parecia recente, estava cauterizado e não havia sangue em lugar algum. Tentei perguntar através de gestos o que havia acontecido com sua perna, ele explicou, também através de gestos, que havia perdido há umas semanas atrás em uma explosão. Minha cabeça doía como nunca, tinha certeza que o soldado possuía perna até pouco tempo atrás.
    Num súbito, ouvimos barulhos de tiros e passos próximos ao acampamento, o alemão rapidamente pegou suas coisas e começou a falar desesperadamente algo que eu não podia compreender mas conseguia deduzir, ele queria fugir, se fossemos pegos por qualquer um dos lados seríamos julgados como desertores. Pegamos o que podíamos carregar e me movi para ajudar o soldado a caminhar mais depressa apoiando-o em meu ombro, com poucos segundos de caminhada minha cabeça voltou a latejar ao ponto de perder minha visão por poucos segundos, quando voltei a enxergar, o alemão continuava do meu lado mas dessa vez não tinha mais o braço direito que usava pra se apoiar em meu ombro. Minhas pernas fraquejaram me fazendo cair ao chão, a dor em minha cabeça só aumentava e o soldado alemão agora gritava em desespero, por alguns segundos perdi minha visão novamente e desta vez a estranheza estava também em mim, havia um par de olhos em meu braço como se sempre estivessem la, e o soldado não possuía apenas buracos em total escuridão onde estavam seus olhos, comecei a gritar totalmente fora do controle mas poucos segundos depois senti minha energia desaparecendo até apagar novamente, e de novo e de novo, a cada vez que recobrava a consciência o alemão estava mais desfigurados, em um momento senti dentes a mais em minha boca e o alemão não possuía alguns, na próxima sentia como se houvesse uma segunda pele por baixo da minha e o homem tinha pedaços de pele faltando em seu corpo, isto ocorre por diversas a  ponto de restar apenas um corpo putrefato em pé diante mim gritando como se estivesse em plena saúde, e eu me sentir num corpo totalmente bizarro como uma criaturas saída de filme de horror, neste momento entrei em colapso e apaguei completamente.
  Depois disto, minha primeira memória é de já estar neste hospital com pouco de consciência e sendo atendido por seus enfermeiros"
  "Bom, é isso doutor…" concluiu
  Neste momento eu estava bastante surpreso com toda história, certamente a mais bizarra que já passou em meu hospital.
   "Entendo o porquê do seu receio, sr. Ernesto, certamente não é uma história comum, contudo não é nada impossível pois, acredito que o que tenha ocorrido de fato é que você tenha de fato matado o soldado alemão e o seu cérebro tenha criado a fantasia do acampamento para de livrar do sentimento de culpa porém o stress causado pela guerra talvez tenha deturpado essa realidade, você já havia matado alguém durante a guerra?"
   "Apenas feri soldados, mas nunca matei"
   "Isto fortalece ainda mais minha teoria, bom se não sentir se bem lá fora, pode voltar quando quiser por meio de contato com o exército"
   Prescrevi alguns remédios para suas dores de cabeça e para ajudá-lo a dormir, o homem parecia mais leve após ter me contado sua história. Acompanhei-o até a saída, ele parecia um tanto nervoso, chegou a vomitar no lixo mais próximo, havia um pouco de sangue em sua boca, ele disse estar tudo bem e partiu. Quando me aproximei do lixo com o vômito para dispensá-lo senti um cheiro horrível, e lá junto ao vômito de sangue estavam 2 pares olhos, alguns dentes e restos de pele humana. Fechei o saco de lixo e joguei-o no latão e nunca mais ouvi falar daquele homem.
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Atualizado em: Seg 6 Jun 2022

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