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Encardido
Em prematura decrepitude morreu em situação de penúria e asfixiado por dívidas e penhoras mas postumamente foi resgatado na poeira cósmica da internet e com qualidade que nunca lhe havia sido atribuída em vida seus escritos remetiam ao processo de recolonização da nação paranga desde o início desse período nebuloso da política nacional em que precisou deixar a vocação artística de lado para atuar em outras áreas e seu filho mais velho ria de piadas obscenas que hoje não podem ser compartilhadas e o filho mais novo se lamentava diante do sanduíche de mortadela molhado com a groselha que vasou na lancheira e o sobrinho foi fazer a barba no hospital porque a namorada teve que desligar o telefone porque havia chegado a pizza mas deixou um livro que foi escrito em seu leito de morte em que criticava quem condenava o conhecimento e valorizava a barbárie e no qual citava o tio como influencia artístico-literária especialmente pela linguagem que visava atingir a massa para a qual a atividade literária não existe e para a qual uma estranha noção de normalidade a escraviza e calcado no princípio de que a justiça não virá dos culpados e que os ricos dividem entre eles o que roubam dos pobres propunha que o fim da humanidade não será de forma alguma o fim do planeta que continuará após uma limpeza por parte da natureza que é muito mais forte que a mesquinharia humana e sem qualquer pretensão utópica de reconhecimento por sua retórica humanista viveu sua vida agregando valores artísticos e estéticos aos poucos utensílios domésticos que possuía no rancho sem nome onde não ignorando a razão sabia que seu lugar no mercado da vida seria uma fogueira onde se queimariam livros críticos ao chamado senso comum.