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crítica

  • Caçando demónios por aí

    Certa vez, enquanto lia a Revista Action Hiken, descobri um shonen de traços bem legais. Mas quando comecei a ler, me deparei com uma linguagem formalista. Um português truncado e de leitura arrastada. Eu achei os diálogos engraçados. Juro, as vezes eu tinha que ler duas vezes para entender. Por um momento, levando em consideração o contexto da história e os personagens, achei que deveria ser um elemento narrativo.
              Pesquisando um pouco mais sobre o mangá Demon Hunter, e o seu autor, o Diogo Cidades, descobri que se tratava de um jovem mangaká português. Aí sim ficou claro aquele modo de escrever tão distante de minha realidade. Convenhamos, salvo raras exceções, somos todos coloquiais. A península Ibérica é um celeiro de mangakás. Espanha e Portugal tem diversos talentos nesse estilo de desenho, o Diogo é um deles.
              Demon Hunter possui caracter designer que se encaixa perfeitamente em sua proposta: entreter. Confesso que os traços me remeteram automaticamente ao autor Hiro Mashima. Um desenho simples, mas dinâmico, caricato e de expressão cômico. Mais que simpático, funcional. É um shonenzão, e isso é bem positivo, levando em consideração a antologia em que está sendo publicado e o público alvo.
              A história se inicia com um acampamento de May Lionheart e um amigo, que estava cheio de más intenções. Infelizmente, naquela floresta e àquela hora da noite, eles acabam se separando. Para piorar de vez a noite de terror, acabam sendo atacados por um capeta dos zinfernos, ou como os portugueses dizem, um demónio. Nesse momento, surge nosso protagonista de cabelos prateados e salva a noite, Mike Seikatsu, o caçador de demónios.
              Depois disso, a May é levada pelo Mike até o mosteiro onde vive. Lá, só habitam ele e o seu avô, o Mayuge Seikatsu, um velhote safado, pra variar. Ao longo dos cinco capítulos, vemos o desenvolvimento da amizade entre ambos os protagonistas. Uma relação cheia de química, com direito a alguns echis, nada exagerado, viu crianças! É um quadrinho sincero em sua violência, afinal, são demónios a serem combatidos.
              Mas, se eu tivesse que tratar de um ladrão de cena, bem, esse é o Steve, o macaquinho cozinheiro. A cena da luta entre Steve e Mike é impagável, e provocaria elevação de ânimos entre ambientalistas. O autor desenvolve bem as personalidades ali presentes, lhes dando profundidade, sem cair na exposição desnecessária de muitos shonen. Ele vai com calma, sabe onde está indo, e isso te empolga a descobrir mais.
              Pouco do universo foi apresentado no vol. 1, mas podemos ver ali uma série de mistérios, que, se bem desenvolvidos, trarão ótimas reviravoltas dentro de seu universo. Por exemplo: qual a origem dos poderes do Mike? Porque os demónios se transformam em pérolas ao morrerem? Quem controla esses seres? Enfim, teremos uma longa saga a ser acompanhada.
              A decisão dos editores de adaptarem alguns termos da escrita do Diogo Cidades, foi uma ótima decisão. Ajudou muito. Os países lusófonos, como Brasil e Angola, falam português oficialmente, mas, possuem uma variação muito complexa. Deve ter dado trabalho adaptar a linguagem para ambos os leitores de ambos os países, deixou a escrita mais fluída sem perder o seu sotaque português.
              Teve só uma coisa que me incomodou no mangá: onomatopeias. Em alguns quadros, são grafadas em caracteres latinos, em outros, em japonês, noutros, aparecem em japonês e latino! Tá meio bagunçado isso aí. Tem que padronizar. Isso gera uma cacofonia visual. Sem contar que deve ser difícil ficar mudando a editoração a cada página ou capítulo, perde-se muito tempo nisso. Embora, não atrapalhe a leitura de ninguém.
              Sobre o desenho do Diogo Cidades, ele tem boas influências e vem de uma boa escola de estilo. Alguns desenhistas evoluem ao longo de anos, outros a cada obra, alguns ainda por capítulo, o Diogo evolui a cada quadro. Sério, o traço do cara evolui proporcionalmente a cada virada de página. Muitas vezes, quadrinistas como os da Action Hiken é o que não encontramos em algumas antologias japonesas semanais.
              Fiquei mais que satisfeito em conhecer esse mangá luso-brasileiro — espero que o autor não veja problema nisso, afinal, é produzido em Portugal, mas é editado e publicado no Brasil. A obra tem mais de 140 páginas, orelhas, galeria de fanarts e curiosidades da produção. Senti falta das páginas coloridas, mas, entendi os motivos, encareceria a produção. E sobre a qualidade gráfica?
              Olha, serei sincero com vocês, se outras editoras tivessem o mesmo esmero em suas publicações como o Estúdio Armon, teríamos HQs melhores produzidas na estante. O projeto gráfico e a impressão estão excelentes. Nada de off white xexelento. A capa, a lombada, a colorização, gente, tá tudo muito bom. O único defeito do negócio, é que ainda não temos previsão do volume 2. Parabéns ao Diogo Cidades e ao Estúdio Armon.
  • Calidoscópio

    para tia Francisca Miriam

    Do outro lado    odal ortuo oD

    Ohlepse on ameop o    o poema no espelhO

    Não esconde nada    adan ednocse oãN

    Sarvalap sa euqrop    porque as palavraS

    São apenas um jogo    ogoj mu sanepa oãS

    Oãça-snegami ed    de imagens-açãO

     

     

     

     

     

     

     

     





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    © "Copyright" do Autor, IN: Concursos literários do Piauí. Teresina, 2005, Fundação Cultural do Piauí. 226 p. Página 192.
  • Cão Morto

    Muito morto, tanto quanto pode ser. Sim. E mais: Contente.
    Senti uma bofetada no rosto. Ele não, estava morto. Um morto não se assusta com um vivo, muito menos aquele desvivido, bravo. Negaram, abandonaram, maltrataram e por fim, mataram-no. E mesmo assim, permanecia como um monumento anônimo numa rua perdida de uma Curitiba estranha. Olhos escancarados em desafio inconveniente à vida que lhe foi tão custosa, a língua para fora estancando um sorriso macabro.
    Voltando ao golpe. Fui pego de surpresa, mas é redundante, golpes são assim. Eu que, arrogantemente, andava em plena vida nesse mundo de imortais, me virei, dei de cara com a morte. E ela me esbofeteou. Justo. Sem aviso ou mensagem, interrompi sua peça póstuma em ousadia digna de gente. Como quem não quer nada adentrei em sua morada e chutei o trabalho de sua, ironicamente, vida.
    Mas foi ela (a vida) quem primeiro me bateu, a fragrância de milhões e milhões de seres vivos lutando uma batalha infinda pelos restos do cão, excretando compostos dos mais variados e malcheirosos. Desculpa, menti, afinal a vida e a morte são a mesma donzela, e seu tapa era igual. E ele ria, em deboche. Ele? Sim, o cão.
    Porque, fruto do desprezo de milhares de pessoas estava ali, morto mas nunca tão cheio de vida, contra a vontade de todos que empinaram o nariz a ele. Havia vencido. Pela ação de milhões de decompositores cada pedaço de matéria em sua carcaça renasceria, era imortal e isso lhe dava certo contentamento a morte e a vida que teve.
    Um dia, pensei eu afagando o rosto moralmente doído, ele será gente, e empinará o nariz para aqueles que um dia lhe foram irmãos no abandono. Ai eu entendi. Tempos atrás, havia sido cão e, algum dia, amaldiçoei essa raça esnobe e estranha que me negava. Ironicamente, em uso do ciclo interminável da matéria, eu renasci gente e tive a chance também de negar meu passado oculto. Devo tê-la tomado, não lembro, o que torna o pecado ainda pior.
    Ele ria entre moscas e tive pena, por fim. Meu rosto já esfriava, o dele era o próximo. As mil próximas vidas lhe custariam muito mais que essa, ele ria, morto, contente, inocente.
  • Caridade pela metade

    O homem moderno não quis dar alimento, nem água, nem abrigo a quem pediu, pois ninguém estava lá para ver e aplaudir. Ele foi embora com o coração cheio dos seus preciosos pronomes possessivos.

  • Cascas de Semente

    Era um sábado quando vi nuvens de tempestade se aproximando. Ventos fortes atingiam a cidade em um fim de tarde, e a escuridão que se aproximava estragou o lindo pôr do sol que estava prestes a acontecer. Pássaros cantavam enquanto voltavam para as suas casas em busca de proteção.

    A chuva é boa para diversas pessoas, mas ruim para muitas outras. Infelizmente, não tinha como pensar nessas pessoas quando a chuva estava vindo, afinal não tinha nenhuma delas por perto para me lembrar disso. Ao contrário de boa parte da cidade, estava abrigado quando trovões soavam e raios eram vistos no meio dos relâmpagos. Porém eu ainda podia pensar em algo. Antes dos trovões, quando a tempestade ainda estava para chegar, era possível ver uma árvore da janela da qual eu estava perto. Ela estava carregada de grandes cascas de sementes, a maioria seca, com tons amarronzados, duras e velhas. O vento forte venceu quase todas, exceto duas. Elas não pareciam mais jovens do que as outras, eram simplesmente normais. Estavam no mesmo galho, mas eu não conseguia crer que só sobraram elas. Procurei por um longo tempo, examinando cada parte da árvore, porém não tinha nada além delas.

    Agora, já de volta com os raios e relâmpagos, fiquei me perguntando sobre o porquê de duas e somente essas duas tentarem resistir a uma tempestade mortífera. Elas podiam estar com medo de se soltarem e do que viria depois disso. Esse medo pode ter paralisado elas, impedindo que se juntassem as outras que já estavam no chão. Talvez também quisessem ver mais uma vez a paisagem lá de cima antes de serem jogadas para todos os lados pelo vento forte. Porém há uma outra explicação que particularmente me encanta: as duas cascas de semente, mesmo já estando velhas e terem visto muito isso, queriam apreciar o seu último pôr do sol que ocorreria no dia seguinte, já que este lhes fora surrupiado. Pode ser que, em sua morte, elas só queriam ver o sol sumindo devagar mais uma última vez enquanto uma brisa suave, e não um vento violento, as retirava calmamente de seu galho.

    Essa última hipótese me cativou tanto que de cinco em cinco minutos olhava pela janela para verificar se elas continuavam lá. Não queria fazer isso, lutava contra essa vontade de ficar observando elas para poder me concentrar em outros afazeres, mas simplesmente não conseguia. Percebi, então, que eu estava torcendo pelas lindas cascas de semente. Queria que elas sobrevivessem para que pudessem ver o seu pôr do sol.

    Peguei no sono antes da tempestade terminar e a primeira coisa que fiz quando acordei foi olhar pela janela. Lá estavam elas, as duas grandes sobreviventes. Esperei até o sol começar a dar tchau e me sentei embaixo da árvore para comemorar essa vitória com as cascas de semente. Depois disso, não quis mais olhar pela janela, pois não queria ver a morte das minhas duas heroínas.
     
  • Celeiro de José

    O dardejar dos raios de sol pressagiava mais uma aurora naquela fazendola no interior agrestino. As sabiás e os bem-te-vis desatavam a cantar e as cigarras já indicavam o castigo solar que vinha. Seu José acordou tremendamente diferente, tinha tido um pesadelo que talvez prenunciasse a algo. Acordou abatido, mesmo assim, não se deixou levar pelas intempéries oníricas, foi metodicamente realizar seus quefazeres cotidianos: ordenhar a vaca, cuidar da ração dos bois e carneiros, alimentar as aves; enquanto isso Maria, sua mulher, estava preparando o café. Quando foram tomar café, maria notou josé muito abatido e questionou-o: 
    —o que aconteceu com você? 
    —nada não mulher. 
    —deixe de enrolação, sei muito bem quando está incomodado com alguma coisa. 
    —deixe de bobagem e vá tomar seu café. 
    —Mas num vou de jeito nenhum. cuide e desembuche logo. 
    —eu já disse 
    — você num disse nada. pois tá bem. 
    e assim maria saiu arretada da cozinha. Durante a tarde, após José chegar da roça, maria notou muito estranho; ele estava escrevendo algo em um papel. Maria ao vê-lo, gritou: 
    —Que danado tu tá fazendo agora? 
    —nada não 
    —endoidou agora. Este matuto tá escrevendo agora. Meu Deus, é o fim do mundo. 
    —não tô escrevendo. Cuide procurar o que fazer. 
    —Vish maria, tá perdendo o juízo. Nem cinquenta anos tem ainda e já tá pirando. 
    Após esse ínterim, Maria foi preparar uma sopa para o jantar. Seu José ainda não saiu do quarto e isso causou novamente um grande incômodo a maria. Ao terminar a sopa, maria pegou uma colher de pau e foi até ele descobrir o que estava fazendo. 
    —O que danado tu tai fazendo zé. 
    —já disse, nada. 
    —cuide, me dê esse papel aí. 
    E maria ferozmente tomou o papel da mão de josé e ficou muito surpresa, ele não estava escrevendo e sim desenhando; desenhou uma espécie de casa. 
    —que diabos é isso agora? você virou desenhista foi? 
    —não! disse ele friamente 
    — e o que é isto então? 
    —já falei que não é nada. 
    —Mas num to cega. Você vai me dizer dum jeito ou doutro. cuide desembuche de uma vez hôme. 
    —Eita mulher para aperrear meu juízo. Isto aí é apenas um desenho que veio na minha cabeça. 
    —pra que tu quer isso? 
    —pra nada. 
    foi quando maria pegou uma vassoura que estava no quarto e ameaçou ele impiedosamente. Ele, temendo levar umas porradas, acabou contando o que estava por trás daquele desenho. 
    Maria ao ouvir, disse que ele estava bem doido mesmo. José calmamente retrucou: talvez! 
    No dia seguinte josé foi coletar madeira para tal projeto e isso deixou maria perplexa. 
    Passaram 4 meses, José estava prestes a terminar o seu projeto. Maria cada dia ficava mais preocupada com a loucura dele. José de tempos para cá, começou a trabalhar incansavelmente, plantando, colhendo, estocando, construindo... 
    Quando por fim terminou seu projeto, não aparentava uma casa e sim um grande celeiro. Ele estocou comida não só para ele como também para seus animais. Os vizinhos acharam josé muito estranho, eles se perguntavam o por quê de tanto trabalhado, e além do mais, para quê um celeiro no sertão. Certa vez, veio uns primos distante até a casa de José, com uma pretensão implícita, eles vieram trazer alguns produtos orgânicos como forma de omitir sua verdadeira intensão: descobrir o porquê dessa construção. Ao passar o dia, eles em uma conversa trivial, acabaram induzindo ao questionamento do celeiro. José disse que era para se proteger contra o frio, e assim, eles discretamente riram, e retrucaram: 
    —Seu zé, de onde é que esse frio virá? Aqui é sertão e o único frio que tem é o da geladeira. 
    José por um momento se omitiu mentalmente, refletindo sobre o seu sonho assustador. Após alguns segundos, ele retornou e disse: 
    — Certa vez tive um sonho curioso. E que me fez fazer isto. 
    — Que sonho, conte-nos? 
    — A terra quente e amarronzada do sertão ficava fria e branca. 
    —Mas zé, ter pesadelos é normal, pesadelos e sonhos são distorções da realidade. 
    —tempos atrás, sonhei durante 2 semanas o sertão morrendo, não pelo calor e sim pelo frio, nos dois últimos dias da sucessão de sonhos, vi uma casa no meio do gelo, era grande e abrigava animais, era o celeiro que fiz. 
    —Zé, aqui é agreste, é até difícil chover, imagine gear . Sertão é seco, nem Antônio estava certo, quando disse que o sertão ia virar mar. E agora vem você, dizendo que vai nevar. 
    —Se não acreditas, não cabe a eu julgar. O que eu tive foi uma visão, que por mais que seja bobagem, a convicção que tenho é que esta estiagem vai dar lugar a uma passagem, em que ninguém ia imaginar. 
    E assim, seus primos saíram rindo, e josé calado ficou, Maria cada vez mais preocupada com José, pensou que ele deva está doente e que o sol quente tenha fritado seu juízo. 
    Em uma noite calma, uma chuvinha fina dançava sobre as telhas. Acresce que, aos poucos essa chuvinha começava a engrossar, e José na cama dizendo que a hora já ia chegar. De manhã cedo, José acordou, a chuva ainda estava forte, pegou um guarda-chuva, e foi até seus bichos guardar no celeiro. Quando voltou molhado, a mulher se arrepiou, pensava ela: será que ele está certo, será que com o dilúvio a neve vai chegar?. Mas tarde a chuva parou e o sol novamente raiou, sem piedades evaporou tudo que na terra foi abençoado. O calor reinou e com isso maria viu que josé estava errado. José não ficou preocupado, disse a maria que no seu sonho, aquilo era um aviso, e mas tarde a neve ia chegar. Passaram semanas, meses, e o sol cada vez mais forte, o sol castigava tudo e todos, a água estava escassa e josé ainda não desanimou. Maria estava com medo de José perder o resto do juízo que tinha com aquela ideia fixa. Após 3 meses do projeto de josé ter sido finalizado, a chuva começava a lavar a terra estéril, o pasto vagarosamente crescia, os animais se deliciavam, as seriemas gritavam anunciando a vida que nascia do solo rachado — era o paraíso. José sempre com a convicção iminente, tinha fé na sua profecia. Os meses foram se passando e a seca foi reinando, tudo que em um momento vivia o apogeu, viu seu declínio sendo devastado com sol... 
    Até hoje os bisnetos de José levam a profecia do tataravô como uma emblema. Quem sabe um dia do sertão o sol se canse, da chuva a neve surja e José fique lembrado como um profeta do passado, que tanto foi criticado, com seu sonho enigmático.
  • Círculo

    Para a Poetisa Diana Pilatti

     

    Palavra: fetiche

    Palavra: fantoche

    Palavra: feitiço

    Palavra: fantasma

     

     

     

     

     

  • Coisas

    Palavra

    falada,

    calada

    palavra

     

    Palavra

    calada,

    falada

    palavra

     

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    falada

     

    falada

    palavra

    calada

     

     

     

     

  • Coletânea "Futuro? Qual será?"

    Sinopse
    Apresentamos a Coletânea "Futuro? Qual será?". Esta é uma Coletânea de Contos Futuristas, de Ficção Científica ou não, sejam Utópicos ou Distópicos (na "onda" de "O Conto de Aia"), que apontem para uma visão de futuro para a humanidade. A questão é: No que vai dar tudo isso que está acontecendo? Onde vamos desembarcar?
    Essa é nossa vigésima Coletânea e nela o leitor encontrará os 25 melhores Textos (na percepção dos julgadores) dentre 56 inscritos. O tema desta Coletânea foi sugerido por John Dekowes, Cesar Luis Theis, Grégor Marcondes e Rafael Sousa; e escolhido dentre várias sugestões. Como nas coletâneas anteriores, a Capa desta obra desenhada por Leonardo Matoso é a capa escolhida pela maioria dos Autores que se inscreveram para a coletânea, dentre 4 (quatro) inscritas para participar da seleção. Continuamos com nossa política de termos em nossas Obras a participação democrática não só de Escritores, mas também de Designers e Leitores.
    Desejamos uma agradável leitura a todos e até a próxima!
    Autores selecionados para esta coletânea:
    Adnelson Campos
    Alberto Arecchi
    Caliel Alves
    Camuccelli
    Carlos Lopes
    Cesar Luis Theis
    Davi M Gonzales
    Gabriel Soares
    Gilberto Vaz
    Giovane Santos
    Igor Martins Lima
    José Luiz Teixeira da Silva
    Leonardo Matoso
    A. Thompson "M. A. Thompson
    Madson Milhome
    Mario Cesar Santos
    Mauricio Duarte
    Milton Jorge da Silva
    Ricardo Gnecco Falco
    Roberto de Jesus Moretti
    Rodrigo Barradas
    Sergio de Souza Merlo
    Sérgio Macedo Ferreira
    Tauã Lima Verdan Rangel
    Thiago Viana Leite
  • Como comecei a escrever? - Parte 1

    Eu nasci em Araçás, uma cidade pequena de coração grande. Aos meus 14 anos eu me mudei para Alagoinhas. Araçás é uma cidade satélite de Alagoinhas, essa última concentra diversos serviços que as demais não possuem. Sem contar o comércio e as faculdades!
                Já estabelecido em Alagoinhas, mais especificamente na sua Zona Rural, passei a estudar no CETEP/LNAB e trabalhar na roça. Venho de uma família de lavradores. E dos meus quatro irmãos mais velhos, só eu entrei no Ensino Superior.
                No Ensino Médio Técnico Integrado eu cursei Técnico de Informático. Embora tenha me decepcionado com a área, aprendi muitas coisas a forjei muito boas amizades, entre alunos e professores.
                Dentre esses professores eu destaco Delson Neto, professor de Filosofia, e Sérgio Luiz de Artes, o poeta e artista plástico Serluzpe. No meu período de estágio obrigatório, eu fui para o setor de tecnologia da SEDUC de Alagoinhas. Lá, trabalhei com Lucas, Marcelo e Joedson. Seu Domingos era o meu monitor. Foi na SEDUC que aprendi os meandros do serviço público e como a educação funciona por dentro, num registro institucional da coisa. Foi na SEDUC que conheci dona Dani, dona Celia e dona Vanuza.
                Nesse período eu comecei a escrever. Embora tenha que ser sincero, eu odiava escrever! Acalmem-se, eu vou explicar.
                Eu sempre adorei ler. Na escola eu tive muita dificuldade em aprender a ler a escrever. Fui alfabetizado tardiamente, na terceira série, quando já havia repetido um ano nessa série. É óbvio que os exercícios de caligrafia e interpretação de texto deixaram sequelas graves. Adquire um hábito de leitura compulsivo, porém, a escrita me era algo muito tedioso. A repetição mecânica da escrita me trouxe grande desconforto na minha trajetória escolar.
                Para minha surpresa, certo dia o professor Sérgio Luiz fez um concurso em sala de aula. Os alunos deveriam fazer um poema e apresentar em sala de aula. O melhor ganharia um livro de poesia de autoria do professor, Revelações. O objetivo era franco, não tinha nada a ver com competição. Era apenas um singelo incentivo a criação e fruição literária.
                Quando sai da aula, fui direto para a SEDUC (esse era o meu percurso todos os dias durante sete meses, pela manhã escola, a tarde era estágio).
                Era um dia de pouco trabalho na SEDUC. Então peguei uma folha de caderno e imaginei o que pousaria no papel. Durante várias horas fiquei olhando para aquela folha branca dividida em linhas precisas. Fechei o caderno. O que escreveria? Embora gostasse de ler eu odiava poesia! Sério, eu lia romance, novela, conto, crônica... até bula de remédio, menos poesia. Não entendia qual era o barato daquela coisa. Os versos nada me diziam, independente de qual escola fosse o poema ou o autor. Lia Drummond com a mesma impaciência e desprendimento com que lia Shakespeare.
                Mas nem tudo estava perdido. Eu tinha alguns exemplares de Bleach, um anime e mangá publicado na Weekly Shonen Jump da Editora Shueisha, autoria de Tite Kubo. Esse autor colocava sempre uma poesia na página de abertura do mangá. Pela primeira vez na minha vida eu lia uma poesia que me tocava em algo. Elas eram totalmente diferentes de qualquer poema que já tivesse sido obrigado a ler na escola numa prova de Português.
                O primeiro volume de Bleach que li foi o 37, na capa estava o personagem Yumichika bem despojado e elegante, um dos meus preferidos dentro da obra. Na capa estava a inscrição The Beauty is so Solitary. Não precisa saber inglês para saber o que está escrito aqui. Quando abri o volume, estava lá um poema, ao invés da tradicional ilustração inédita. O poema dizia o seguinte:
    Não acho as pessoas belas
    Como acho que as flores são
    Pessoas só são flores
    Quando caem mutiladas pelo chão.
                Isso transmite uma beleza e uma paixão cega que eu nunca tinha visto. Eu nunca tinha tido contato com a obra de Tite Kubo, conhecia o pouco que lia através de revistas da Editora Escala como a Anime Dô e a Revista Neo Tokyo, títulos que passei a colecionar. Não tinha computador ou internet para assistir na net, a pirataria nunca trouxe, e comprar o mangá como um colecionador nunca foi possível. Eu adorava a estética do mangá, e para ser bem sincero, achava que ele se passava no Japão Feudal!
                Bem, continuando. Quando eu li o dito volume 37 de Bleach, me apaixonei pela obra. E adquirindo outros exemplares, percebi que isso ocorria em todos os volumes. A própria linguagem do mangá remetia a todo tempo a figuras de linguagens poéticas, com inúmeras camadas de significações.
                Quando resolvi abrir o caderno novamente, esqueci tudo que sabia sobre poesia. Se tivesse que escrever alguma coisa, seria do meu jeito, com minha forma e com o que eu gostava. Então resolvi escrever uma poesia homenageando Bleach de Tite Kubo. A base da poesia foi Ichigo Kurosaki, protagonista da obra. Um personagem com o qual me identifico muito, tanto na personalidade quanto nos ideais.
                Então escrevi no papel minha primeira poesia:
    Orange ranger
    Há um certo cavaleiro laranja
    Que nem bainha sua espada tem
    Quebra a máscara a procura de identidade
    E quando se reconhece, ainda não é ninguém.
                Evitarei aqui as explicações pedagógicas, quem é fã do mangá vai entender muito bem as referências. Considero também que o trabalho do escritor é ser narrativo/descritivo, não explicativo. Esse último papel cabe ao crítico literário.
                Passei o texto a limpo numa folha de papel de ofício.
                Na próxima aula com o professor Sérgio Luiz, ele cobrou a entrega do poema. Mas só eu levei, ninguém dos mais de trinta alunos além de mim fez o poema. Se ele ficou decepcionado, não demonstrou. Ele pediu para eu recitar. Fui lá na frente do quadro com certa timidez e recitei, mesmo quando ninguém prestava atenção. No fim ele me deu o livro Revelações, que tem uma capa linda demais.
                Não sei se vocês perceberam, mas eu ganhei o livro por WO!
                Vou ser sincero a vocês, meus colegas é que perderam. Depois desse fato, eu não tenho como explicar e nem me inclino a saber porque, não parei de escrever poemas. Mas essa história eu vou deixar para as próximas postagens. Continuem a acompanhar os trabalhos.
  • Como profissionais medianos podem tentar chegar ao sucesso!

    Ah! Como é fácil ser um profissional feliz e realizado...
    O atual cenário brasileiro necessita de uma rápida reviravolta para continuar competitivo frente aos demais países do mundo. Para se ter uma ideia em 2012 o Brasil estava em 48º lugar no ranking de competividade global do Fórum Econômico Mundial. O último resultado geral divulgado em 2019 mostra o Brasil em 71º lugar.
    Em uma visão geral todos ás áreas e segmentos contribuem para este resultado. Mas vamos pegar como exemplo a área de gestão de produção que reflete bem o problema estrutural de muitos profissionais em suas diversas áreas de atuação.
    O profissional de produção desempenha um papel fundamental na gestão dos processos de produção em uma empresa. Ele é responsável por garantir que as atividades ocorram de forma eficiente, dentro dos prazos estabelecidos e de acordo com os padrões de qualidade definidos. Ele deve estar atento às novas tecnologias e tendências do mercado. Ele precisa acompanhar os avanços da sua área de atuação, identificar oportunidades de melhoria e implementar inovações que possam aumentar a eficiência e a produtividade da empresa. A sua atuação é essencial para o sucesso e crescimento sustentável de uma empresa.
    Para se desempenhar um papel profissional como esse é necessário muito mais do que experiência e expertise. É necessário estar em constante evolução saindo da mediocridade (do latim mediocris, médio) pois senão irá ficar para trás.
    Falando em nisso, o filósofo brasileiro Mario Sergio Cortella define mediocridade como você chegar da escola com o boletim escrito: 6,0 em português, 5,5 em matemática, 4,0 em história… e dizer: ‘deu pra passar’. Medíocre! Isso é mediocridade. Porque uma pessoa medíocre é aquela que podendo fazer o seu melhor se contenta em fazer só possível.
    Mediocridade é falta de capricho. Capricho é você fazer o teu melhor na condição que você tem.
    A mediocridade é um fenômeno social que se manifesta quando as pessoas se contentam com o mínimo e não buscam se desenvolver e evoluir constantemente.
    A mediocridade nos impede de alcançar nosso potencial máximo e de contribuir para a sociedade de forma significativa.
    A mediocridade é o oposto da excelência, e pode ser encontrada em diversos aspectos da vida, desde a educação até o mundo empresarial.
    A mediocridade é um problema que pode ser solucionado por meio da educação que tem o poder de transformar as pessoas e de incentivar a busca pela excelência.
    A educação deve estar centrada na formação de indivíduos críticos e reflexivos, capazes de pensar por si mesmos e de contribuir para a sociedade de forma significativa.
    Vale enfatizar a importância da ética na luta contra a mediocridade. A ética é fundamental para a formação de indivíduos comprometidos com valores e princípios sendo capazes de agir de forma íntegra e responsável em todas as áreas da vida.
    As reflexões sobre esse assunto têm sido amplamente difundidas no Brasil onde a redução da mediocridade e a busca pela excelência têm inspirado muitas pessoas a repensarem suas atitudes e a buscarem uma vida mais significativa e plena.
    A busca pela excelência e a ética são fundamentais para a realização plena do ser humano e para a construção de uma sociedade mais justa e humana sendo um fator necessário para recuperar as posições perdidas pelo Brasil no ranking de competividade global do Fórum Econômico Mundial. Há quem diga que não existe dias cinzas para quem sonha colorido eu, porém digo que não dias concretos para aqueles que apenas sonham colorido.
    E então: - Como profissionais medíocres podem tentar atingir a excelência profissional?
    – Deixando de ser medíocres! 
  • Conceitos e discursos sobre a auto inscrição africana

    A construção da identidade dos povos africanos, durante muito tempo, esteve permeada por discursos racialistas e estereotipias. Imagens cambiantes de uma realidade concreta. Com o posicionamento de pensadores e teóricos de África, tais convenções, antes tão válidas, começaram a cair em descrédito. Já não conseguiam mais responder aos questionamentos acerca da identidade dos africanos. Mas, isso correu numa longa duração.
              Até o início do século XX, antes de uma revolução epistemológica promovida por pensadores africanos e estrangeiros que se debruçavam sobre o tema, tudo que se sabia sobre o continente africano estava baseado em mitos e preconceitos. O próprio filósofo alemão, Hegel, afirmava que a África era a-histórica. Um território e população com existência disfuncional no planeta Terra. Deslocada da humanidade como um todo.
              A Europa Ocidental, em seu processo de expansão econômica e geopolítica, se pôs como centro do mundo, assentando África numa zona periférica — e outros lugares como Ásia e América Latina. Uma linearidade histórica se forjou, uma espécie de escala diacrônica da história mundial. Tem como marco inicial a Grécia Antiga e se conclui no projeto da liberal-democracia contemporânea (DUSSEL, 2005).
              Essa perspectiva é teleológica e eurocêntrica. O eurocêntrismo é um etnocentrismo singular. É tanto uma ideologia, pois suas ideias mobilizam as ações dos indivíduos, enquanto os integra ao sistema, um paradigma por servir como um modelo básico, e discurso por estabelecer uma “verdade” (BARBOSA, 2008). O provincialismo europeu-ocidental se tornou uma cosmovisão.
              Era impossível que a História da África, a memória, e identidade do “eu africano” não estivesse condicionada, em um primeiro momento, por preconceitos e estereótipos. África foi criada de fora para dentro, numa relação que pouco levou em conta o Outro. Ela aconteceu numa perspectiva binária, quando não maniqueísta: “Europa civilizada” em contraponto a “África bárbara”.
              Após nos situar, definimos cinco os fatores que constituem ou interferem na auto inscrição dos povos africanos: “raça”, colonização, escravidão, “diáspora” e a Independência dos Estados-Nações africanos. É uma complexa genealogia que deve levar em conta vários aspectos, “(...) através dos processos de escravidão, colonização e apartheid, o eu africano se torna alienado de si mesmo (divisão do self)” (MBEMBE, 2001, p. 174).
              Dentre os fatores supracitados, “raça” é um dos que mais pesa. A confusão entre o ser negro e ser africano ainda causa dificuldades epistemológicas, bem como políticas e sociais. Imensa maioria dos africanos se reconhecem como pertencentes aos seus respectivos povos. Um único país pode estar configurado em diversos povos, e esses povos podem estar agrupados em unidade étnicas maiores.
              Muitos pensadores ocidentais, principalmente os afroamericanos do século XIX, transformaram a África, de modo apriorístico, no lar ancestral dos negros de todo mundo. Embora as “raças humanas” sejam construções sócio-históricas de mesmo período: “A ‘África’ de [Alexander] Crummell é a pátria da raça negra, e seu direito de agir dentro dela, falar por ela e arquitetar seu futuro decorria — na concepção do autor — do fato de ser negro” (APPIAH, 1997, pág. 22).
              A “raça” continua a ser um empecilho para compreender África pelo seu caráter homogeneizador, negando o que esse continente tem de mais particular: sua diversidade. Entretanto, no século XXI, para muitos, o conceito não está descartado como base para interpretação das realidades de africanos e de suas respetivas Nações. Mas, há sim uma busca por criticar e estabelecer novos parâmetros.
              Raça é uma das “barragens de mitos” mais resistentes da História de África, com um grande impacto nas representações e da construção da identidade (KI-ZERBO, 2009). É algo tão forte e arraigado, que durante muitos anos, nos primórdios da Egiptologia do século XX, havia uma distinção entre a África Negra e a África Branca (o Egito). Mitos bíblicos e racismo se somavam à metodologia científica, e assim nascia a Dual-África.
              Um outro pensador africano cunhou o termo “mitos científicos” para designar essa ação: “o trabalho dos homens de ciência produziu também de maneira mais insidiosa, ao lado das reconstruções históricas mais refletidas e mais duradouras, estereótipos tanto mais persistentes pois apareciam aparelhados com todos os emblemas da legitimidade ‘científica’ ou acadêmica, ao mesmo tempo em que confortavam as falsas evidências do senso comum” (M’BOKOLO, 2009, pág. 49).
              A ciência que deveria estar a serviço da busca de uma “verdade” por meios teórico-metodológicos, ou seja, rigor objetivo em detrimento dos pré-conceitos e preconceitos, acabou por legitimar visões de mundos racistas. Destituiu os africanos de suas várias identidades e de sua autonomia social e histórica. Tudo isso serviu a um propósito político e ideológico dos invasores europeus.
              A colonização, embora tenha ocorrido a longo prazo, diferindo de método e tempo pela região de contato, causou um abalo na auto inscrição africana. Muitas vezes, os colonizadores obtiveram contribuições desses povos nativos no processo de dominação. Portanto, a identidade passou por um processo de mediação com o “outro” invasor.
              Um dos fenômenos dessa colonização europeia em África foi o comércio de escravos no sistema-mundo, deslocado do Mar Mediterrâneo para o Oceano Atlântico. A pré-existência da escravidão no continente africano à chegada dos povos ibéricos não pode ser comparada com o período de escravidão entre os séculos XVI e XIX entre África e América. Potências da Europa Ocidental foram os maiores comerciantes de seres humanos do mundo na Era Moderna, seguido pelos traficantes brasileiros.
              Se a chegada dos árabes no norte-africano aumentou a escala de escravização de seus povos, o comércio transatlântico transladou milhões de africanos. América Portuguesa, Hispano-América e até mesmo o Japão Feudal se beneficiaram da mão-de-obra escrava. Logo, se os africanos eram negros, pertencentes a uma mesma “raça”, a escravidão provocou uma “diáspora”.
              O termo tenta fazer uma analogia a condição dos judeus. A diferença é que os judeus, sempre estiveram em condição de imigração constante, uma “terra prometida”, uma origem ancestral comum e um livro sagrado para mobilizar a solidariedade a nível supranacional. O holocausto judeu é outro fator a se considerar no período atual. A Segunda Guerra Mundial criou o Estado de Israel como reparação histórica, bem diferente da situação do Estado da Libéria, reduto de ex-escravos estadunidenses em África.
              Por fim, analisamos o processo de independência dos Estados-Nações africanos. Devemos entender que esse processo ocorreu tanto em conflitos armados, quanto diplomáticos e políticos. A negociação da Independência não elimina as divergências ou exacerbações de facções políticas. Os processos de Gana e de Angola são bem diversos se analisados de perto, mas os conflitos estão em ambos.
              Cientistas, pensadores e literatos africanos se engajaram politicamente nos processos de Independência e de (re)construção de suas Nações. Dentre eles, filósofos, antropólogos e historiadores evocavam a “tradição” africana como base para uma “filosofia africana” (MUDIMBE, 2013). A História tinha um papel importante por legitimar a narrativa histórica construída pelas novas elites nativas.
              Essa primeira geração ficou conhecida entre historiadores contemporâneos como “Geração Militante”, pois defendiam posições nacionalistas e raciais:
    o primeiro grande historiador africano desta geração dos anos 1950 e 1960 foi o senegalês Cheikh Anta Diop, criador do Afro-centrismo. Em livros conhecidos como Nações negras e cultura (1955) e Anterioridade das civilizações africanas (1967); traduzido para o inglês como As origens africanas da civilização, (1973), Diop retomou, de forma transformada, uma tese do século XIX, de que o Egito fôra uma civilização negróide; tida como origem cultural do mundo helenístico (por conseqüência, greco-romano) e das sociedades africanas [sic] (BARBOSA, 2008, pág. 51).
              Os nacionalistas e o marxistas discursaram em defesa da africanidade e de suas respectivas Nações, porém:
    (1) as narrativas marxistas e nacionalistas sobre o eu africano tem sido superficiais; (2) como consequência desta superficialidade, suas noções de autogoverno e de autonomia têm pouca base filosófica; e (3) seu privilegiamento da vitimização, em detrimento do sujeito, em última instância resulta de uma compreensão da história como feitiçaria (MBEMBE, 2001, pág. 177).
              Mesmo sem consenso acerca dos limites da interferência da escravidão, colonização e os regimes de apartheid na auto inscrição africana, seria improfícuo descartar sua influência no processo. Muito dessa construção identitária africana esteve marcada pelas lutas intestinas, discursos racialistas, guerras civis, intervenção político-econômica das grandes potências, e atualmente o terrorismo islâmico etc.
              A auto inscrição em África, tanto sofre interferência das representações construídas sobre o continente, bem como pelas condições socioeconômicas e diversidades culturais imanentes. A formação de identidade não depende de uma coerência histórica, nem unidade étnico-racial, mas todos esses elementos estão em sua constituição. O debate está posto, mas, talvez, sejam os atuais africanistas e historiadores africanos que estejam chegando mais perto de uma resposta.
    Referências bibliográficas
    APPIAH, Kwame Anthony. Na casa de meu pai. A África na filosofia da cultura. In: ________A invenção da África. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.
    BARBOSA, Muryatan Santana. Eurocentrismo, História e História da África. In: Sankofa. Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana, nº 1, jun.2008, p. 46-63.
    Disponível em: <> acesso dia: 30 jan. 2020, às 18:43 horas.
    DUSSEL, Enrique. Europa, Modernidade e Eurocentrismo. Edgardo Lander (org). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Colección Sur Sur, CLACSO, Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina, set. 2005.
    KI-ZERBO, Joseph. História da África negra. Vol. I. 4 ed. Lisboa: Edições Europa-América, 1999.
    M´BOKOLO, Elikia. II. Debates e Combates. In: África negra. História e civilizações – Tomo I (até o século XVIII). Salvador/São Paulo: EDUFBA/Casa das Áfricas, 2009.
    MBEMBE, Achille. As formas africanas de auto-inscrição. In: Estudos Afro-Asiáticos, nº 1, 2001, p. 171-209.
    MUDIMBE, V. Y. A invenção de África. Gnose, filosofia e a ordem do conhecimento. Lisboa: Edições Pedago, 2013.
  • Conversando Com O Silêncio

    Conversamos por horas, sem dizer apenas uma palavra.
    As pessoas estão muito ocupadas em suas vidas barulhentas para escutar o que o silêncio tem a dizer.
    Se tornaram adversários de um aliado valioso, o tempo.
    Em uma competição que não parece ter vencedores.
    Elas estão perdidas…
    Estão apenas tentando fazer algum sentido...
    Os fracos estão aí para justificar os fortes.
    Mas ainda há esperança, talvez, apenas talvez você possa ser um dos escolhidos.
    Um dos abençoados por Deus.
    O resto de nós apenas rezamos para que o amanhã seja melhor do que o ontem costumava ser.
    Enquanto isso o silêncio se mantém mudo.
    Apenas aguardando o seu momento, o momento de finalmente ser escutado.
  • Crítica ao conceito de Feminismo no Brasil

    O Feminismo é um verdadeiro saco de gatos conceitual. Dentro dele foram jogados todos os movimentos sócio-políticos das mulheres no Brasil. Um enquadramento generalizante e empobrecido da atuação do ser feminino dentro da nossa sociedade. Toda vez que mulheres ousaram desafiar o status quo e lutaram pela sua emancipação, logo lhes foi atribuído os espaços da “esquerda” e do “comunismo”. Um bloco monolítico sem diversidade ou contradições internas, algo que não se sustenta num estudo mais aprofundado.
              O movimento feminista remete a Inglaterra do século XIX. É partir daí que as mulheres da pequena-burguesia se unem pela sua inserção em novos espaços sociais e políticos. Nem todas as mulheres estavam inclusas, foram ejetadas do Feminismo as mulheres de outros grupos étnico-raciais e de outras classes sociais. Podemos estabelecer que esse movimento político e articulado das mulheres em relação a sua emancipação é de gênese liberal. A ideologia teve rápida proliferação e aglutinação em países do Ocidente capitalista.
              Essa praxe não se confunde com o comunismo. Para as feministas, a luta se restringe a emancipação do feminino, ou seja, dos espaços sociais convencionais que aprisionaram as mulheres — a mãe, a esposa, a devota religiosa etc. —; já para os comunistas, a luta se dá no nível socioeconômico, não está focado nas questões identitárias. Sendo o primeiro movimento nascido das correntes políticas do liberalismo econômico das potências europeias, e o outro da classe operária, teremos muito mais relações históricas de conflitos que de diálogos.
              Isso não significa dizer que mulheres comunistas não estivessem atentas e atuantes às questões femininas, de sua luta política e liberdade sexual (LIMA, 2008). Mesmo sem estarem vinculadas ao Feminismo ou se auto declararem, suas ações podem ser consideradas em alguns casos como feministas. O real problema é quando esses fatos são usados para homogeneizar, estereotipar e estabelecer uma unidade até então inexistente dentro do próprio movimento feminista, “o feminismo tem sido, nas últimas décadas [a partir da década de 1960], um movimento internacional, mas possui características particulares, regionais e nacionais” (SCOTT, 2011, p. 69).
              Embora não seja o nosso objetivo fazer periodizações, podemos estabelecer os anos de 20 e 30 como o primeiro momento de atuação mais objetiva do Feminismo no Brasil,
    “[...] [mulheres] especialmente de camadas socialmente privilegiadas, organizadas em diferentes grupos na luta pela libertação do gênero feminino. Parte delas se reconhecia feminista, a exemplo da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) [...]. Outra parte, apesar de se posicionarem de forma contundente contra a inferiorização das mulheres, não se assumia feminista, como a maioria — senão todas — das mulheres do PCB” (ALVES, 2019, p. 182).
              Houve períodos de maior ou menor atuação das feministas, sendo condicionado pelas rupturas democráticos que o Brasil passou. A exemplo do anarcofeminismo, só podemos lhe fazer menção a partir de maio de 68, sendo ampliado através do movimento punk; isso no que diz respeito strictu sensu ao nosso país. Em si tratando do comunofeminismo, independente das representações que o passado nos legou, só será visto em maior atuação na década de 90, quando o processo de reestruturação dos partidos de esquerda no Brasil se abriram aos movimentos sociais.
              O Feminismo é uma força política real e atuante, no Brasil e no mundo. Mas de modo algum livre de contradições e reveses. Nem de longe unitário. Não devemos elencá-lo ao espaço da massa amorfa e indivisível; nem tão pouco repetir estereotipias ipsi litteris sobre a condição social e histórica das mulheres e sua luta política. O correto seria dizer “feminismos”, muitas vezes em conflito. São vários direcionamentos que, quando interseccionalizados, mostram um movimento heterodoxo e em constante renovação. Ser feminista no Brasil pode significar muitas coisas para as mulheres, mas com certeza não é uma unidade determinada.



    REFERÊNCIAS
    ALVES, Iracélli da Cruz. A política em prosa: representações comunofeministas em A sombra do patriarca. In: BATISTA, Eliana Evangelista; SILVA, Paulo Santos. (Org.). Dos fios as tramas: tecendo histórias, memórias, biografia e ficção.  Salvador: Quarteto, 2019. p. 171-188.
    LIMA, Luciano Rodrigues. Parque Industrial, de Maria Lobo (PAGU): resistência e utopia nos subterrâneos da Era Vargas. In: SENA JUNIOR, Zacarias F. de; SILVA, Paulo Santos. (Org.). Salvador: EDUNEB, 2008. p. 273-290.
    SCOTT, Jean. História das mulheres. In: BURKE, Peter. (Org.). A escrita da história: novas expectativas. São Paulo: Ed. Unesp, 2011. p. 65-98.
  • D. Gray Man e o ofício do historiador

              Katsura Hoshino é uma das mangakás mais geniais. Ela é a criadora do mangá shonen D. Gray Man. A obra foi publicada na Weekly Shonen Jump em 2004, ainda em andamento. Os quadrinhos se tornaram sucesso por trazer uma trama rica em reviravoltas e ação, estética gótica e mitologia cristã para as suas páginas. Um dos elementos dessa trama, o Clã Bookman, nos ajuda a discutir algumas questões do ofício do historiador.
              Mas antes de aprofundar a discussão, é necessário responder a seguinte pergunta: que seria a História? Para mim, é uma ciência que busca compreender as relações humanas no tempo e no espaço, em sentido retrospectivo, ou seja, do presente para o passado. Perguntamo-nos no presente e voltamos ao passado através das fontes que os nossos ancestrais nos legaram.
              Se o ser humano estuda e analisa a história do ser humano, como manter a objetividade e não ser condicionado pela sua própria condição humana? É daí que o mangá de Hoshino irá nos ajudar a questionar a busca de objetividade do historiador em seu ofício.Em D. Gray Man, a trama aborda uma guerra santa entre dois grupos, a Ordem Negra, uma organização monástico-guerreira sob a tutela do Vaticano, e a Família Noah, um grupo de seres imortais descendentes de Noah, uma referência ao Noé bíblico. A história do mangá é permeada de fantasia e simbologias, mas não iremos tratar desses assuntos aqui. O que nos interessa é o papel que o Clã Bookman possui nessa guerra e como realizam o seu oficio de historiadores.
              O termo bookman é de origem inglesa, e a grosso modo significa “o homem do livro”. Na Europa Medieval, era uma espécie de historiador particular vinculado à nobreza. Quando Suas Altezas Reais iam a guerra, costumavam contratar os serviços de homens letrados para registrar suas proezas em batalha. Muitas vezes esses relatos eram feitos sobre encomendas, se é que o leitor me entende.
              O ofício do bookman não é exclusivo da Era Medieval, existem registros de tal função em outras civilizações e regiões do planeta, como a China Imperial onde tal historiador recolhia os mínimos detalhes da vida do imperador, inclusive suas relações sexuais. Mas como grande parte de nossa história é de cunho eurocêntrico, acabamos não sabendo mais detalhes desses outros historiadores.
              No mangá, eles são um clã. Apesar do termo, não parecem ter um antepassado em comum ou ter relações consanguíneas. Sua estrutura se assemelha mais a uma organização secreta do que há um clã. Eles estão espalhados pelo mundo todo, e são financiados em suas pesquisas e outras questões por membros do Clã Bookman, algo semelhante aos historiadores da vida real que realizam pesquisas custeadas por terceiros, seja o Estado ou instituições privadas.
              Os membros do clã possuem acesso a acervos privados e particulares, possuem um idioma próprio e possuem memória eidética, ou seja, memória fotográfica. Esses elementos são importantes para a minha análise. Cada bookman faz um registro na Tora, um tomo usado para escrever os capítulos da guerra. Cada registro da guerra santa recebe o nome do bookman responsável pelo registro.
              O atual responsável pela escrita é o bookman junior e exorcista da Ordem Negra, o Lavi. Aprendiz de Bookman, seu mentor, ou se você preferir, orientador. Lavi é nosso representante no mangá. O jovem ruivo é o que nós podemos chamar de graduando em História. Foi recrutado aos 6 anos de idade, sendo órfão de pai e mãe, foi praticamente adotado pelo Bookman, e desde então estuda para assumir o lugar do velho Bookman.
              Esse personagem nos chama atenção devido ao seu visual. Usa tapa-olho, e um longo cachecol no pescoço. Uma bandana cinge a sua testa. Sua arma é um martelo chamado Tettsui, do japonês “Martelo de Ferro”, capaz de aumentar o seu tamanho. Além disso, sua arma possuí o poder de controle elemental através de selos místicos. O personagem tem uma personalidade carismática e profunda. Ele já protagonizou uma light novel da história e foi cogitado para protagonizar o mangá, segundo a própria Hoshino.
              Lavi não é o nome de batismo do personagem, ele abdicou desse nome logo ao se aliar ao Bookman em suas pesquisas. Lavi é o 49º nome que ele assume, logo, percebemos que o nosso protagonista tem um problema com a constituição de sua identidade. É como se ele estivesse em busca de uma identidade que revelasse algo mais que uma função. Abdicar do nome original é uma forma de romper laços com sua antiga vida e condição existencial. Essa busca pela identidade se manifesta em sua personalidade flutuante entre momentos de grande carinho e de extrema frieza.
              Embora não seja cego de um olho, ele usa uma venda no olho direito. Isso implica uma visão unilateral do mundo, visto que, apenas um dos olhos é capaz de enxergar a realidade. O martelo é outra forte simbologia em relação ao personagem. Esse instrumento representa: demolição, iconoclastia, ruptura com os dogmas e modelos anteriores. O próprio filósofo Friedrich Nietzsche dizia que “filosofava com o martelo”.
              Entre os bookman, existe um ideal de neutralidade e de objetividade no ofício. Os bookmans, mesmo quando se aliam há um lado ou outro do conflito, não fazem por ideologia ou sentimento de pertencimento, mas sim porque conseguem acesso a informações e documentos dentro da Ordem Negra e da Família Noah. Numa primeira análise, não parece que os historiadores em D. Gray Man possuem um senso de moral. Mas essas filiações temporárias parecem ser uma contramedida para garantir a neutralidade do historiador.
              Essa ideia se aproxima do pensamento do historiador alemão Leopold von Ranke, importante teórico da História no século XIX. Segundo ele, o historiador de ofício deveria ser rigoroso em seu método, e se anular perante as fontes. De acordo Ranke, através do método, seria possível fazer “falar os documentos”. Nesse sentido, o historiador seria menos intérprete e analista dos fatos históricos e mais um mediador dos discursos e representações que as sociedades nos deixaram registradas.
              Esse pensamento dominou o ofício até o início do século XX, quando foi questionada pela Escola dos Annales. Encabeçados pelos historiadores franceses Lucien Febvre e Marc Bloch, eles propunham uma história-problema, e não uma história narrativa. Foram descartados os elementos políticos, individualistas e cronológicos da História, o que acabou criando novas abordagens e inclusão de novos temas e objetos de pesquisa. Isso renovou a História e possibilitou uma crítica teórico-historiográfica.
              No mangá, a associação entre bookman e organização se dá há nível de interesse mútuo. Através de alianças temporárias, eles obtêm acesso a arquivos e podem registrar a história através de seu testemunho, já as organizações que associam os bookmans, acabam se servindo de seu vasto campo de conhecimento e experiência. Isso provoca uma série de conflitos entre Lavi e Bookman.
              De acordo o orientador do bookman junior, ele não deveria interferir no ciclo da história, cabendo como o seu único papel registrá-la. Ou seja, alguém que contemple e não aja para modificar a ordem das coisas, o que contrária qualquer perspectiva marxista. Mas Lavi não consegue ser omisso e acaba interferindo de maneira contundente na guerra que ele deveria ser expectador. Estaria a neutralidade abalada pela atuação de Lavi? Um historiador engajado ou militante é capaz de encontrar a verdade na história?
              O conceito de verdade pode se alterar em diferentes épocas e regiões. Para o povo Asteca, era verdade absoluta — e necessário — sacrificar pessoas diariamente ao sol para que ele se movesse no céu e não punisse a humanidade com a escuridão. No período medievo, a Igreja Católica estabeleceu que vivíamos num sistema geocêntrico e que a Terra era plana, os que contestassem essa verdade eram queimados em fogueiras. Logo, a verdade ou a noção da realidade é uma construção histórica e social.
              Não há nenhum demérito a História ser reescrita, revista e ampliada, visto que, ela não deixa de ser um produto sócio-histórica produzido pelos seres humanos. Nenhuma ciência, seja ela da área de humanas ou naturais, pode se dar ao luxo de ser dogmática. A ciência é essencialmente pragmática, caso contrário, estaria fadada a ser fixa e nunca evoluir em sua produção de conhecimento.
              A ideia de que existe uma neutralidade absoluta nas Ciências Naturais, porque seus cientistas estudam e pesquisam algo externo ao ser humano, não passa de pura ideologia. O que eles buscam tanto refutar acaba se tornando o que mais defendem. Onde está a neutralidade do físico quando ele ajuda o exército a construir bombas atômicas para matar pessoas? Onde está a neutralidade do virologista que elabora armas virais? Onde está a neutralidade do cientista da computação ao criar sistema de precisão balísticos em armas autônomas e drones?
              O historiador pode ser engajado em alguma causa, sem com isso perder a objetividade em seu ofício, pois, História não se faz com ideologias, e sim com metodologia. A única coisa que pode nortear essa questão é a problematização da historicidade, entendida aqui como a contextualização do tempo e do espaço histórico, e do rigor metodológico. Rigor no sentido da crítica externa e interna das fontes, diálogo interdisciplinar e revisão pelos seus pares.
              O historiador de ofício não deixa de ser um detetive temporal. Um detetive não cria pistas, ele as coleta, as analisa com cuidado, visto que, um erro na sua investigação pode condenar ou safar alguém de um caso. Se a produção historiográfica destoa muito dos fatos históricos, o que o profissional produziu não foi historiografia, e sim propaganda ou ficção histórica. Deixemos a ficção histórica para os escritores e literatos e a propaganda para os publicitários. Nosso objetivo é produzir ciência, conhecimento do processo histórico. Lavi não deixa de ser um historiador por ser atuante dentro da história.
              Nem é menos objetivo por causa disso. D. Gray Man e o Clã Bookman nos ajuda a discutir essa contradição pela busca da absoluta neutralidade, algo que deve ser refutado. Os seres humanos são seres lógicos, mas também são seres desejantes ou instintivos. A produção de conhecimento e os critérios de verdade mudam dependendo de seu contexto histórico. Se os homens não são fixos e determinados, a História também não pode ser.
    REFERÊNCIAS
    D. GRAY MAN ENCYCLOPEDIA. Bookman Clan. Disponível em: < https://dgrayman.fandom.com/wiki/Bookman_Clan > Acesso 26 fev. 2021, às 16:39 horas.
    D. GRAY MAN ENCYCLOPEDIA. Bookman. Disponível em: < https://dgrayman.fandom.com/wiki/Bookman > Acesso 26 fev. 2021, às 16:42 horas.
    D. GRAY MAN ENCYCLOPEDIA. Lavi. Disponível em: < https://dgrayman.fandom.com/wiki/Lavi > Acesso 26 fev. 2021, às 16:55 horas.
    D. GRAY MAN ENCYCLOPEDIA. Lavi/History. Disponível em: < https://dgrayman.fandom.com/wiki/Lavi/History > Acesso 26 fev. 2021, às 17:01 horas.
  • Desabafo

    Oi
    sou eu de novo
     
    venho dizer que não aceito
    não quero ser um ser humano 
    quero ser gato ou planta
    dog ou árvore
    poderia também ser um godê
    ou uma vela
     
    uma toalha de mesa
    ou um isqueiro
     
    mas não
    eu tinha que vir como humana
     
    pra perecer como um homem
    ainda em corpo feminino
    sangrando todo mês
    e com sonhos de uma sociedade mais justa  
     
    romântica ainda
    ansiosa ainda
    depressiva ainda
     
    e quase-suicida
     
    vamos pular essa parte
     
    que diabo é pra eu fazer nesse planeta?
    nessa era, nessa época?
    por que não faço logo e me zarpo noutro segundo?
     
    tenho que ficar aqui existindo e sustentando esse corpo humano cheio de demandas
     
    arre!
    vou fazer o quê, se não, existir?
     
    fico me metamorfoseando todos os dias
    rabiscando poesias e alquimizando lágrimas
     
    confecciono meus dias na base da porrada
     
    me arrasto pra vida
     
    toda hora apaixonada
     
    sem concluir as paixões
     
    que acabam antes mesmo de começar
     
    sou só mais uma frustrada
     
    querendo mais um pouco num mundo onde tem gente que não tem nada e tá bem mais satisfeito e agradecido que eu
     
    queria morrer logo
    parar de sentir dor de dente
    de sofrer com medo de não prosperar
    de ficar com vontade de fazer sexo e não poder fazer sexo com a pessoa que se quer
    de parar de sofrer pelo... @
    de parar de esperar a próxima semana pra ver....#
    de se masturbar sozinha
     
    de montar atividades trabalhosas em um sistema falido de ensino, ainda mais híbrido 
    onde não se consegue dar atenção para os alunos online e presencial ao mesmo tempo x.x
    de ver gente passando fome e sede e não tendo água e banheiro
    de guerras esdrúxulas
    de mortes ridículas
     
    estou eu aqui bem alimentada aquecida desabafando no meu notebook gostoso
    e o mundo lá fora perecendo e ruindo
    e a maior parte das pessoas humanas morrendo de fome sede e crueldade e violência
     
    sou um bibelô numa bolha
    estou resguardada por uma família magnífica
    mas estou triste
    sou uma pessoa triste
    infeliz de estar nessa roupagem humana
    de dor e convalescência 
    e algumas parcelinhas de prazer
    mas muito mais dor e sofrimento, muito mais
    muito mais desilusão e amargor
    muito mais sapos bois na garganta
     
    sei lá
     
    só queria morrer logo...
  • Desçamos todos a cova

    O cemitério é a linha de chegada de todos nós. Somos os únicos seres que temos a certeza da morte, e lembramos durante toda a vida de nossa melancólica sina. Foi com sentimentos fúnebres que participei da Antologia Campos Santos da editora Sem Tinta. A editoração e publicação aconteceu no ano de 2020, recebendo financiamento coletivo através do Catarse.
              O tema da obra foi o cemitério no século XIX. O livro foi organizado por Guilherme Milner e Erick Alves, contando com 14 contos de autores nacionais das mais diversas regiões do Brasil. Esse cenário nos possibilitou escrever variados contos, sejam eles apelando para o terror, a ficção história e o romance. O projeto gráfico ficou excelente, Erick Alves mais uma vez mostrou sua competência no projeto gráfico.
              A obra acabou sendo publicada em um momento de pandemia, provocada pelo COVID-19. O clima sombrio desses tempos de morticínio e necropolítica parecia ser um momento pouco adequado para esse tipo de literatura, mas, contrariando nossas expectativas, o livro conseguiu ser financiado com sucesso. Nós escritores nos esforçamos muito para que esse trabalho fosse publicado.
              O resultado ficou muito bom, começando pela capa, tem o tom sinistro para ambientar a obra. O prefácio ficou a cargo de Guilherme Milner. São mais de 200 págs., com orelhas. Cada capítulo é ilustrado com uma imagem padrão e biografia dos autores e autoras. Muitos desses escritores e escritoras já são meus conhecidos, e os contos me agradaram muito.
              Nessa coletânea eu publiquei o conto O misterioso caso da cidade de Benza’ Deus, conto ambientado no interior da Bahia, tratando de sanitarismo, epidemias e eventos estranhos na construção de um cemitério municipal. Agora farei um comentário sobre os três contos que eu mais gostei. Lembrando que esse tipo de análise é particular, e se refere mais a minha experiência de leitura.
              A epidemia de morte foi escrita por Danilo Mattos Ferreira. O protagonismo é o viúvo Artur Gonzaga, que perdera sua esposa Carolina e filho após a gravidez que terminara em uma eclampsia. O conto foca em crenças das caças as bruxas — ainda corrente no século XIX —, e misoginia. Tem um final surpreendente! Realmente eu não esperava aquela resolução.
              Alexandre Torres escreveu o ótimo conto As melhores linguiças desse mundo. O caso narra uma série de crimes ocorridos em 1863-64, envolvendo canibalismo. Inclusive, o caso foi abafado pelas autoridades policiais e acabou sendo registrado até por Charles Darwin em seus escritos. O autor reconstruiu os atos hediondos de José Ramos com tonalidades fantásticas, deixando a coisa ainda mais aterradoras.
              O terceiro que mais gostei foi O pesadelo das duas covas do Pedro Martinez. Esse conto oferece uma trama curta, mas muito instigante e bem construído. A história trata sobre Abraham, um homem que acaba passando por uma terrível experiência: seriam seus pesadelos uma terrível premonição? Na busca dessa resposta, ele consulta um espiritualista, e decide refazer os eventos do seu pesadelo.
              De modo geral, o livro está excelente. Com boa impressão e encadernação, orelhas e papel offwhite com páginas escurecidas na apresentação de cada conto. O prefácio instiga a leitura e ajuda muito a entender o contexto histórico. Muitos dos contos tratam de terror, e serão em apreciados pelos fãs do gênero. Recomendo muito a leitura para aqueles que não tem medo de lápides e portões rangentes.
  • Desejo

    para Gláucia (ex-noiva)

     

     

    Quero

    a nudez do teu corpo

    estampada em meu rosto.

     

    Em teus olhos, quero o amor

    e o seu espanto, o gosto da vez primeira

    e o teu último instante da minha espera...

     

     

     

  • Desídia

    A “preguiça de pensar”
    é a pandemia do momento,
    ela apresenta um sintoma severo:
    a convivência com “teorias da conspiração”!
    Obrigando, os distraídos, à aceitação
    de qualquer “terraplanismo”,
    sem analisar ou questionar,
    baseados, apenas, em “achismos”!
    Desta forma, “caindo” em qualquer clickbait,
    e, “comprando” qualquer fake news,
    para deleite de todos os haters,
    que as “viralizando” sem compaixão,
    distorcem estatísticas da verdadeira pandemia:
    Um governo sem solução...
    e mínima empatia!
    (*) Desculpem os Estrangeirismos, foram necessários.
  • Deus me deu ?

    Deus me deu minha casa
    Enquanto varias pessoas perderam suas  em enchentes 
    Deus me fez passar no vestibular 
    Enquanto varias pessoas não ter conseguido estudar por falta de oportunidade 
    Deus me curou de uma doença 
    Enquanto varias pessoas morrem na fila de espera de um hospital 
    Deus me deu um carro 
    Enquanto varias pessoas vivem trabalhando 10 horas por dia para um dia tentar comprar um carro em 60 vezes 
    Deus me deu ?
    O que fez você ser tão especial ?
    Rezou ?
    Antes de falar que “Deus me deu “ “foi Deus “
    Pensa no próximo, olhe para o lado e veja um pai dando só um presente para um filho e o outro só ficar olhando . Seria correto?
     Reflita!
    Ninguém deu nada , você conquistou pelo seu esforço , méritos seus .
  • Dia da árvore

    Hoje é dia da árvore.
    Como comemorar esse dia?
    É nós que precisamos dela.
    O ar que respiramos vem dela.
    A limpeza do ar também.
    Já plantou a sua árvore hoje?
    Nunca é tarde para plantá-la.
    Há inúmeras mudas para plantarmos.
    Pode ser de frutas.
    Pode ser somente para sombras.
    Pode ser para o ambiente embelezarmos.
    O importante é um só;
    cuidar da natureza!
    Larga a mão de malvadeza!
    Em tudo dependemos da natureza.
    Plante uma árvore!
    Adote uma árvore!
    É o mínimo que podemos fazer.
  • Dissimulado

    O mal não grita, apenas sussurra,
    Influência, distorce...
    Cria “certezas”,
    conspira pós-verdades,
    inspira através de falácias.
    Se traveste de bom moço.
    Dissimulado, roga por clemencia!
    Mas, não ouço!
    Pois, relembro a demência,
    de sua índole incontrolável,
    que o induz ao final,
    mais que provável.
    Mesmo contrário aos fatos,
    conduz, sem resistência,
    por seus próprios atos,
    ao fim da consciência!
  • Distopia

    Que mundo distópico é esse,
    onde “tubaína” vira remédio
    e, fantoche com viés despótico
    prescreve, receita e festeja
    sem que médico,
    ao menos seja?
    Em meio à pandemia
    assistimos incrédulos
    a diversas pantominas,
    em um teatro de absurdos
    onde, morte e doença
    são tratadas como crença ou banalidade,
    estimuladas por um louco menestrel,
    a reger sua orquestra insana
    para deleite de uma plateia sem humanidade!
  • Divórcio com civilidade - Primeira parte.

    Introdução: Na busca por orientar de maneira eficaz aqueles que enfrentam o processo de divórcio, é fundamental ressaltar a importância do respeito ao Estatuto da Advocacia, o qual estabelece normas para a atuação do advogado e a interação entre as partes envolvidas em litígios.
    Este documento é essencial para  as dinâmicas e limitações dentro das quais os advogados operam, garantindo que o processo seja conduzido com ética e profissionalismo.
    O objetivo deste texto é puramente informativo, visando esclarecer as precauções que devem ser tomadas ao compartilhar informações com o advogado da outra parte durante um divórcio. As considerações a seguir não substituem o aconselhamento legal personalizado, mas buscam fornecer uma base de conhecimento que pode ajudar a proteger seus direitos e interesses em um momento tão delicado e crucial.
    Capítulo 1 - Estou passando por um processo de divórcio e conversei com o advogado do meu companheiro. Seria apropriado eu compartilhar com ele os detalhes da nossa convivência?
    Resposta: É importante ter cautela ao discutir detalhes da sua convivência com o advogado da outra parte em um divórcio. Aqui estão algumas considerações que você deve ter em mente: Interesses Protegidos: O advogado do seu companheiro representa os interesses dele, não os seus. Qualquer informação que você compartilhar pode ser usada para beneficiar a posição dele no processo de divórcio.
    Confidencialidade: As informações que você compartilha com o advogado do seu companheiro não são protegidas por confidencialidade. Isso significa que o advogado pode, e provavelmente irá, usar o que você disser em favor do cliente dele. Estratégia Legal: Antes de discutir qualquer aspecto da sua vida ou do seu relacionamento com o advogado da outra parte, é crucial consultar o seu próprio advogado. Ele pode aconselhá-lo sobre o que deve ou não ser discutido, garantindo que suas ações estejam alinhadas com sua estratégia legal.
    Comunicação: Se é necessário comunicar algo ao advogado da outra parte, o ideal é que isso seja feito através do seu advogado. Assim, você garante que a comunicação é adequada, estratégica e protege seus interesses. Em resumo, é geralmente aconselhável limitar o que você compartilha com o advogado da outra parte e sempre fazê-lo sob orientação do seu próprio advogado para proteger seus direitos e interesses durante o processo de divórcio.
    Em conclusão, ao navegar pelas águas muitas vezes turbulentas de um divórcio, a prudência em suas interações com o advogado da parte contrária é de suma importância. Lembre-se de que qualquer informação divulgada pode influenciar o resultado do seu caso. Portanto, é essencial manter uma comunicação estratégica e bem orientada, sempre sob a supervisão do seu advogado. Este cuidado não só salvaguarda seus interesses pessoais e legais mas também ajuda a conduzir o processo de divórcio de maneira mais eficaz e menos conflituosa.
  • Duas asas pra te proteger

    A internet deu vez e voz a diversos artistas independentes. Possibilitou a todos eles divulgarem suas obras e distribui-las a um público que só tende a crescer. Dentre essa vertente de cultura de massa nos meios digitais estão os webtoons. Além de estarem disponíveis em plataformas digitais, esses quadrinhos acabaram por desenvolver um estilo narrativo próprio, mais objetivo e com diagramação diferenciada.
              Quando o mangaká alagoinhense Antonio Alan me indicou a obra Guardiões possuem asas, webtoon roteirizado e ilustrado por ele, tive oportunidade de acompanhar uma história divertida e cheia de potencial. O autor utilizou a temática da angeologia, algo que ele já tinha usado em seu primeiro título, o mangá Knights of God: Sacred Armors, um B-shonen inspirado em Cavaleiros do Zodíaco. Foi usado como TCC!
              A história foca em Darlan, um homem de 30 anos que sente um amor platônico pela sua amiga Sueli. Depois comemorarem seu aniversário, ela o convida a sua residência para maratonar séries. Infelizmente, depois de voltar para casa, o protagonista acaba sendo assassinado pela coisa mais assustadora atualmente em nossa sociedade: dois malucos de moto num beco tarde da noite.
              Resultado: Darlan toma um tirambaço nas caixas dos peitos e vai pro beleléu. Depois de acordar, ele descobre estar numa dimensão espiritual. Não mais como um humano, ou alma penada. Darlan é o mais novo anjo aprendiz, de nível 500. Mas não pense que isso é algo positivo, pois a hierarquia de poder é decrescente. Depois de uma leve introdução, o novo anjo irá descobrir seus poderes e limitações.
              Como eu já conheço o autor, considero esse trabalho cheio de potencial. Humor na medida certa. Personagens cativantes e com personalidade. Provavelmente o autor irá optar por seguir uma linha mais b-shonen com anjos e demônios, mas talvez esses embates não sejam tão diretos. Pode haver uma batalha de influência também. É difícil dizer muito, o autor ainda só publicou dois capítulos e um prólogo.
              A colorização, personagens com outras etnias e identidades sexuais são um ponto importante. O que me incomodou, não a ponto de me fazer largar a leitura, foram alguns erros de revisão. Do ponto de vista do roteiro, acho que o excesso de explicação e as reações do protagonista. Não achei a reação do Darlan crível. A arte precisa melhorar na proporção e torção, além de perspectivas. Se isso impede a leitura e a diversão: não! Se você não ler essa obra, só você tem a perder.

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