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  • Uma simples história

    Ainda me lembro! Uma quarta de tardezinha. 4 aula do dia, e a atenção voltada para o português. Ao final o desafio de criar um texto literário. Confesso que um pouco me assombrei. Mas o que temer? Algo que eu sei é escrever.
                Hora de ir embora, segui andando, estava como pássaro que em voo sai do galho sem destino, mas com a certeza de que em outro galho pousará. Já em casa, caneta e caderno velho em minhas mãos, meu desespero começa - mal sabia eu que, aflição maior estava por vir – meu desejo era escrever uma história, já estava tudo em minha mente, faltava apenas jogar no papel.
                Np momento em que pensava dar início ao meu texto, o cachorro vem e começa a brincar, queria minha companhia. Começou cheirar-me, saltar em meu colo. Não tive escolha, fui satisfazer o desejo do meu amigo que me olhava, quase q implorando minha atenção. Instantes depois, volto ao caderno, estava pronto para a primeira palavra desenhar, meu pai chaga e liga a TV, o futebol estava a começar. Não conseguia escrever, não queria assistir, era o barulho que me atrapalhava. Foi necessário ir para um lugar mais tranquilo. Fui para meu quarto. E, com isso, não havia escrito nada.
                Agora sim – pensei comigo mesmo – consigo escrever. Sentado na cama, caneta na mão e caderno no colo... Do nada ouço uma voz “olha o arroz ai!”. Era minha mãe, que clamava do banheiro. Olho para a sala e meu pai continua deitado, sobrou para mim determinada tarefa. Então vou a cozinha, desligo o fogo e volto ao meu quarto. Novamente sento na cama, caneta na mão e caderno no colo.
                Cerca de cinco minutos depois continuava na mesma posição.  De minha cabeça a história sumiu. – Será que o que eu tinha a escrever fosse algo tão incrível que um ser estranho, talvez invisível, padece vir a rouba-la? Um ladrão de histórias. Porque logo eu ser a vítima? Há tantos escritores profissionais que, com certeza, escrevem e pensam melhor do que eu­ – Quem pensamento idiota, não, idiota não, este é um pensamento muito criativo, coisa de quem não está em seu juízo perfeito.
                E continuava a perguntar para eu mesmo. Como alguém pode perder o que não se pode tocar, algo imaginário e que somente eu sabia, existente apenas em minha mente? E esta pergunta acabou ficando sem resposta. Estaria eu louco? E agora como posso ocupar as linhas destas folhas? Podia perguntar algo ao meu travesseiro, com ele estão confidenciados inúmeras coisas referente a amor, medo e sonhos, tudo coisa minha. Onde está meu juízo? Meu confidente falando? Não conheço sua personalidade. E se ele contasse para todos? Que vergonha sentiria.
                Não estou normal, tudo por causa de uma história. Eu aqui sem ter o q escrever e com pensamentos tão absurdos. De fato minha história havia sido roubada, mas quem são os culpados? Talvez tenha sido o arroz, o futebol ou o cachorro, o cachorro? Não, não pode ser, seria ele capaz de tanto? Será que o arroz e o jogo ajudaram o bicho? Um complô contra mim. Que loucura, como posso ser capaz de pensar em tanto e não poder escrever um simples trabalho de escola. Estava me afogando em meus pensamentos.
                Então me dei conta, a ansiedade acabou me enganando, o entusiasmo de escrever era tanto que não havia pensado em nada. Retornei a mim mesmo, é obvio! Não escrevia porque não havia o q escrever. Então sorrindo de mim mesmo, lembrando de cada pensamento, vendo minhas próprias reações de preocupação sendo que não havia nada pra se preocupar. E o pássaro encontrou um galho onde pousar, respirei fundo e comecei a escrever os últimos sessenta minutos de minha vida, a mão em rápidos movimentos foi enchendo a folha de papel e a alegria me consumia a cada palavra desenhada.
  • Uma Taça

    Em uma taça, o sangue dela e um beijo interrompido.
    Minhas noites eram tranquilas até ela entrar na minha cama e dizer: "eu sou aquela que vê seus exorcismos".
    Foi fatal o beijo naquele dia do passado.
    Vampiro, deixei me enclausurar sofrendo a ausência dela. Ela descobriu os meus piores demônios.
  • Uma vida Cyberlife

                Poucas coisas nos angustiam como o futuro. Essa coisa que apenas projetamos e não vivemos cria sonhos e gera pesadelos. Quando a Sem Tinta Editorial resolveu publicar uma coletânea de contos de ficção científica, a antologia Cyberlife, diversos autores nacionais se empenharam na tarefa de escrever sobre a vida no futuro. A base para isso era a inclusão de vidas artificiais e alienígenas, o que tornava o cenário complexo para nós humanos.
                O organizador Erick Alves acertou em cheio nas escolhas. Em catorze contos, vemos como os terráqueos teriam que lidar com novas formas de vida, sejam elas com ossos de metal e pele orgânica, ou vindo de planetas distantes. O livro mescla vários subgêneros da ficção científica como o cyberpunk e a space opera, além de grandes doses de futurismo. Técnica e imaginação foram essenciais na construção desses mundos.
                O conto que abre a coletânea é o Injeção leta de culpa, escrito pelo Erick Alves. Nessa história ele aborda a relação entre duas personagens: Lady Fox, uma rebelde de um grupo revolucionário chamado de a Corte, e Norene, uma agente policial. Aqui o autor aborda a marginalização da juventude sem esperança e niilista, em contraponto ao corporativismo das instituições e a rigorismo das leis penais. O final foi emocionante e inesperado.
                O texto seguinte, Onde mora a lua do Thiago Franco, foi o que menos gostei. O conto tem uma ótima narrativa em primeira pessoa, e se divide entre as memórias da protagonista como viajante espacial e o seu presente como gladiadora. Embora o título do conto se refira a lua, o satélite teve muito pouca importância. A obra é carregada de nuances poéticas, mas o problema mesmo é o final, com direito até a Deus ex machina. Acabou com o clima de “felizes para sempre”, para o que foi apresentado na trama, soou romântico demais.
                O terceiro conto para mim é o melhor. O Rodrigo Ortiz Vinholo nos trouxe o conto A semente do céu. De todos os contos apresentados, ele apresentou o melhor conceito e também o desenvolveu com muito sucesso. A história narrada em primeira pessoa revela os questionamentos de um extraterrestre que vive em bairros planejados, o que eu entendi como se fossem guetos nos moldes de segregação racial. As sementes a que o título se refere são capsulas espaciais que chegam a terra, e graças a sua alta tecnologia, regeneram a vida em seu interior. O conto aborda de modo muito prolífico o fanatismo religioso e o preconceito racial, bem como as consequências sociais negativas sobre o fato.
                O meu conto vem logo em seguida, e se chama O Bairro Esquecido. Nele eu abordo a história de um bairro onde convergem refugiados, androides, cibercriminosos e extraterrestres. Eu gostei muito do resultado desse conto, e o organizador acreditou na sua estrutura narrativa. Espero que o leitor goste. Para mim foi um desafio escrever um conto sem mocinhos nem vilões.
                Anabel, a poeta é escrito pelo Felipe Del Bosco. Nesse conto o autor aborda de modo poético vários questionamentos sobre o tecnicismo, voltado para a escrita. Ao longo do texto, a protagonista demonstra ter umas fugas da realidade. O cotidiano se torna uma montanha russa de alucinações constantes. O que mais surpreende nesse conto é que a protagonista não é bem o que pensamos no início.
                Jon O’Brien nos traz o conto Crianças aprendem a odiar. Embora a protagonista e a narrativa foquem em crianças, o conto é bem assustador. Uma metáfora para a ausência de humanismo o período de educação infantil, o que torna as crianças cada vez mais violentas e portadoras de preconceitos enraizados de modo profundo. As crianças são o espelho da sociedade, só que sem freios morais.
                Um pequeno ponto pálido é o conto trazido pela escritora Ana Carolina Machado. É a história mais curta do livro, mas rico em detalhes e sentimentos. O primeiro é a solidão, não caber em um mundo, estar a margem de uma sociedade e saber que nunca mais pode voltar para a sua terra natal provoca uma certa angústia. Estar invisível numa sociedade cada vez mais artificial traz mesmo uma náusea na gente.
                O homem de vime é um conto que une o cyberpunk e o thriller psicológico. Yian é um agente policial que tem como missão levar um prisioneiro a Kadath, onde oniromante, seres que controlam a capacidade se sonhar, irão cuidar de extrair as informações de sua mente. Ao longo da obra, temos uma sensação sufocante de déjà vu. Foi um dos contos que mais gostei, o final foi um choque para mim. A imagem do homem de vime a que o autor recorreu é perturbadora.
                O conto seguinte é do autor Paulo Matheus Ferrari. Em seu O som do metal, um homem ganha um violino de um estranho na rua, assim, sem mais nem menos! Ao longo do conto, através desse gesto, o personagem vai se questionando sobre a artificialidade da vida humana. O conceito de mind upload foi legal, mas acho que a história em si careceu de um contexto melhor. O diálogo do protagonista com a alíen foi desconexo em relação a proposta do conto. Achei que o autor ia desenvolver conflitos maiores, mas se limitou a desconfiança e reticências do protagonista.
                Em O jardim, a autora Sabrina Mota Marcondes nos mostra uma protagonista que tenta revitalizar a natureza através de pequenas ações como resgatar plantas. Um conflito em grande escala colocou humanos, robôs e extraterrestres em lados opostos. Confesso que na primeira leitura, você não saberá identificar a qual grupo ela pertence. Parabenizo a escritora, foi genial.
                O autor Mardey Stealth nos traz um conto semelhante ao do Thiago Franco, só que desenvolvido com mais competência, acredito eu. Aqui também temos um protagonista gladiador. Sua única esperança de sair dessa vida de batalhas é derrotar o campeão. Panthogar narra os últimos passos desse guerreiro em busca de liberdade. O autor se permitiu certo exagero no conflito do protagonista título com o campeão da arena, mas narrado de modo mais crível e com um final coerente.
                A autora Fernanda Miranda nos traz um conto com referência direta ao feminismo, mas ao invés de mulheres, temos robotas, e ao invés de uma ideologia, um vírus. F-7 e S.I é o mais cyberpunk dos contos dessa coletânea. A narração é muito boa, porém, os conceitos parecem meio genéricos, tipo “mundo-cópia” e os clichês dos velhos chips neurais. Nesse futuro, as robotas são androides femininas que são usadas para diversão sexual por seus donos, a autora não fala diretamente, e nem precisava. Entretanto, um vírus chamado Sentimentos-Intensos mudam suas configurações básicas, criando uma nova personalidade chamada F-7. E tem uns problemas estruturais básicos: o vírus S.I torna as robotas hipersensíveis, emocionalmente instáveis e desinteressadas, como elas vão se tornar livres nessas condições? E por último, se as robotas foram criadas pelos membros do Conselho Intermundial para auxiliar os humanos, porque são produzidas e vendias em série? Isso é fetichismo da mercadoria. Eu achei o conto bem panfletário! As metáforas utilizadas pela autora não caíram bem. O argumento da história é falho e contraditório.
                Sentimento obscuro é escrito pela Francy Lima. Nesse conto, um velho robô resgata uma criança de dentro de uma capsula de hibernação. Ao longo da história os dois descobrem que tem um passado em comum. Esse é o tipo de conto que peca pelo pouco espaço. Conhecendo esse risco, o autor sabe que sua narrativa pode apresentar soluções vacilantes na trama. Mesmo assim ela cumpriu sua função, mostrou um futuro possível e a relação entre robôs, humanos e extraterrestres. Mas faltou algo mais para prender minha atenção.
                Por último, temos o conto Brand new life da autora Mayra Pamplona. A história foca em Aglaya, a única sobrevivente de sua família após uma infecção bacteriana que provocou milhões de vítimas. Vivendo numa colônia terrificada em Marte, a protagonista vive como ume mendiga, comendo sobras de lixo e o pouco que adquire com seu artesanato. Gostei do clima descompromissado da história. A vida de Aglaya é bem traumática, só achei algumas situações exageradas como quando o robô deu sua chave mestra a alienígena, o que poderia colocar não só a vida dela em risco, bem como a de toda a Bahram. Tirando isso, gostei muito do desenvolvimento da história, mostra um outro lado dos seres humanos, que deveriam ser mis recorrentes.
                Foi a primeira edição, do primeiro do livro da Sem Tinta Editorial, então não serei rigoroso nas críticas. Os pequenos erros que apareceram não impactaram de modo negativo na leitura, e poderão ser corrigidos facilmente numa segunda edição do livro. Um ou dois parágrafos que não estavam com espaço inicial, ou uma palavra sem acento gráfico. Nada que desabone o livro.
                A brochura tem mais de 190 páginas, dividida em catorze contos, que nos dão um gostinho de quero mais. Conta com orelhas, a capa é em Supremo 300g. A introdução fica por conta de Erick Alves.  A capa do livro é sensacional. No fim do livro, temos um anúncio de nova antologia, essa será de terror e se chama Chave das trevas. O livro custa R$ 25,00. Leitura recomendada a todos os leitores de ficção científica.
    Para adquirir acesse:
  • Único Sobrevivente

    Ewerton é um executivo importante de uma grande emissora. Após uma semana bastante complicada, não vê a hora de voltar pra casa e ficar ao lado da jovem esposa. Todavia, um estranho homem que Ewerton jurava não estar ali, puxa conversa e revela algo que só o executivo devia saber. Mais do que isso, o homem diz saber que o avião irá cair em 15 minutos. Se quiser saber o que vai acontecer e o que Ewerton fará, clique no link abaixo e veja com seus próprios olhos.
  • Vai, Mas Volta Logo!

    Teu cheiro já esta em minha pele
    Tua voz ecoa nos cantos sem parar
    Sinto teu abraço e meu corpo cede
    Já é a saudade que ocupa um lugar

    Um amor que não sei explicar
    Meus olhos brilham ao te ver sorrir
    Sei que logo vou te abraçar
    Mas viciei em te fazer feliz

    Amor, hoje somos apenas um
    Um único coração que vive por dois
    Mostrando que somos seres incomuns
    Mas que se encontraram em uma só voz

    Abro mão do meu mundo para te ter aqui
    Sei que meu amor vai ao teu encontro
    Já estava escrita nossa história 
    E assim vamos seguir

    Não esquece que te quero de mais
    Então vai, mas volta logo!
  • Valeu, tio!


    onibus
    Entrou no ônibus após uma pequena corrida.

    Não queria perder a oportunidade que o sinal de trânsito fechado lhe oferecia. Já na roleta, percebeu o missionário que, na forma de vendedor de cocadas, bradava como de costume sua história de conversão aos passageiros.

    Em meio ao testemunho proclamado no interior daquele coletivo, o recém-chegado passageiro caminhou pelo centro do longo veículo a conferir o troco recebido. Não vira o rosto da trocadora, nem do entusiasmado convertido, assim como o da maioria dos trabalhadores que, após mais um extenso dia, voltavam para suas casas através daquele popular meio de transporte.

    Não havia bancos vagos totalmente, apenas um lugar aqui, outro ali, sempre ao lado de algum outro alguém sem rosto e que, para seu desgosto, não muito espaço ofereciam para ele e sua enorme sacola de doces.

    Sim... Da mesma forma que o vendedor de cocadas, também ele, o recém-chegado passageiro, carregava guloseimas. Não portava uma cesta, como o prolixo missionário, mas segurava as alças de uma vultosa bolsa plástica, repleta de chocolates, balas, bombons e outras iguarias.

    Estas não eram para vender, ao custo da solidariedade alheia, em prol dos irmãos atendidos pela casa onde o ex-dependente químico declarava trabalhar; mas sim para o seu próprio consumo.

    No centro da cidade existia uma enorme casa de doces, que vendia em médias quantidades a preço de atacado. O recém-chegado passageiro abastecera-se lá. Sua cota mensal de glicose. Era início de mês e, com o salário recebido no bolso, dera início ao costumeiro estoque.

    Sentou-se ao final do coletivo; no penúltimo banco, pois visualizara um espaço no fundo do ônibus onde descobrira não haver ninguém ao lado, possibilitando-o assim começar a saborosa degustação. Mas, ao aproximar-se, percebera o motivo daquele inusitado vazio, a ele oferecido em plena hora do rush.

    Havia um menino de rua deitado sobre o último assento, ocupando o lugar destinado originalmente para duas ou três pessoas.

    Descalço, maltrapilho e sujo, o dimenor também portava um saco plástico, só que o detinha na altura da boca, pressionado em sua abertura por um par de mãos trêmulas, ainda sob o efeito do alucinógeno vapor.

    O rosto daquela criança em êxtase, retrato cruel da realidade urbana, foi a primeira e única feição avistada pelo homem dentro do coletivo. Torpor infantil. Contraste.

    Asco.

    Então, após entreabrir somente um dos olhos, o menino foi diretamente atraído pela transparência da sacola plástica carregada pelo recém-chegado passageiro; o único a sentar-se próximo a ele.

    Levantou-se com dificuldade e, no resto de inocência que a brutalidade desumana daquela grande cidade ainda lhe permitia experimentar, estendeu os braços na direção da sacola, numa mistura de sonho e realidade.

    “Valeu, tio!”, disse o moleque com o esboço de um tenro sorriso nos lábios marcados de cola.

    Valeu, tio!

    Mais ainda do que o sorriso, ficou marcada na mente do recém-chegado passageiro aquela frase. Alegre. Aliviada. Feliz. Uma simples e pequenina frase. Uma meia sentença. Muito mais rica em sua exclamação. Uma pequena pausa em meio a uma meia vida.

    Sem sua sacola de doces, o passageiro agora não mais era um recém-chegado. Estabelecera contato direto com a plenitude de sentido coletivo. E único. Desfizera-se de sua máscara, seu muro, sua redoma de vidro temperado.

    Temperança.

    Tocado pelas mãos daquela criança, sujas pelo mesmo cimento do intransponível muro agora derrubado, o passageiro já havia feito o verdadeiro percurso. O caminho precursor de todos os trajetos.

    Concretos acessos.

    Pela janela avistava o invisível. Marquises, pontes, viadutos... A cidade estava toda lá fora. Viva. Reflexos convexos de encontro a um complexo coletivo. Cidade. A rima na mente, incoerente, querendo conversa. E se tudo tivesse sido diferente para ele? E se, nessa idade... E se?

    Cidade.

    O doce sentido das palavras, degustado em forma de poesia. O abrupto encontro de realidades perdidas. Perdidas em meio a um insustentável sentido. Idas e vindas. A pressa. O medo. O egoísmo e a falsa sensação de impotência. Desculpas de culpas cabíveis. Reflexa ação do pensar coletivamente. Ônus.

    Ônibus.

    O resto do percurso foi feito em silêncio. Tudo diferente do normal. O vendedor de cocadas desceu; alguns outros passageiros desceram. O coletivo flutuando sobre as trilhas perdidas de uma tarde em despedida. Só havia aquele rosto, agora. E aquela frase...

    Valeu, tio!

    E aquele sorriso infantil.

  • Valuar

    O Vampiro - A Rosa e o Violino
    A rosa envelhecida estava na mesa.
    O violino velho estava repousando nos meus pés nús que mostravam gotas de sangue e uma taça.. Sim, eu era um vampiro.
    A Taça
    A taça quebrou ao ver a luz do sol que queimava ela, minha amada que virou cinzas vinho as quais guardei no fundo da nossa ampulheta, que destilava sempre aquela areia negra tumular dando um eco de amor e silêncio e missa milenar entre duas carnes.
    Uma Aliança Perdida
    Meus pés então estavam vermelhos, um beijo não demos, e agora? O que faria eu sem minha noiva?!! Estava assombrado.
    O Violino - Jardim Cemiterial
    Peguei meu violino quase sagrado e comecei a tocar.
    As rosas misteriosas do meu jardim cemiterial começaram a dançar e dançar ..
    Era lindo de ver aquele dia onde a ampulheta carreava a meia noite para o céu e onde o Universo conspirava ela, minha noiva.
    A Tumba
    Me sentei na tumba dela e de pernas cruzadas aveludadas, um beijo joguei no escuro da noite.
    A Boca Vermelha
    Os anjos viram e escutaram o estalido vindo da minha boca vermelha.
    O Céu
    O céu estava demais e o violino cantando ao léu.
    O Salão - Música
    Entrei no castelo e vi o salão usufruindo da marcha fúnebre de luto de Nerusco, meu fantasma companheiro de drinks e amor.
    O Luto
    Ele tocava pra mim, era o luto e eram as rosas.
    Um beijo vermelho em Nerusco e...
    Nerusco.
    A idéia...
    Dancei, me atraquei a Nerusco, rimos, choramos e brindamos e abrimos os túmulos do jardim até que... Esperei.
    BelezaAbraços
    ... Abraçado a Nerusco.
    Estava tudo lindo!...
    Valuar
    Voltamos ao salão e eu e Nerusco... Abrimos as cortinas negras ao redor da escadaria.
    Deixei o sol entrar e... Minha noiva está linda! Murmura: "Valuar? Criastes negras asas.
    A Rosa e o Violino
    FIM.
  • Vazio

    Ela saiu de fininho
    Ele não fez perguntas
    As dúvidas ainda pairam no ar
    Ninguém as faz questionar
  • VELHO LOBO DO MAR

     A história que irei contar aconteceu há muito tempo atrás. Este conto perde-se nos registros dos grandes bardos. Contudo, apesar de tantos anos, ela ainda é uma historia atual; pois grandes exemplos não se perdem com os anos, são eternos.
     Imaginem uma ilha cercada por tamanha beleza; imaginem grandes montanhas cobertas de relvas e lindos lagos de águas cristalinas, tão cristalinas que dá até para ver o próprio reflexo. Exatamente nesse cenário que nossa historia começa. Desde a antiguidade grandes navegadores partem para o desconhecido em busca de terras para conquistar, e com o Lobo Do Mar não foi diferente. Sim, nesta época, uma época de fantasia esquecida pelos homens, os animais falavam e pensavam como gente. O Lobo Do Mar aportou nesta ilha quando ainda era jovem, junto com seus amigos humanos e amigos bichos. Mas que graça teria se esse conto fosse contado por minha pessoa? Vamos deixar que o Lobo Do Mar nos conte. Vou logo avisando que já faz tempo e por isso ele está velho, mas continua valente como outrora foi.
    *******
     - Sentem-se, crianças. – Digo para meus netos, enquanto nos aquecemos à beira da fogueira nesta noite sem luar. – Vou contar para vocês uma historia.
     - Vovô! O senhor vai contar de quando derrotou a grande Serpente Da Ilha? Assim que sua tripulação chegou aqui? – Perguntou um dos meus netinhos, o lobinho Azul. Batizamo-lo assim por causa da coloração de seu pelo, que puxava para o tom mais azul. Um lobo inteligente, e creio eu, que um dia será um grande alfa.
    *******
     Sem mais delongas, tudo começou quando meu grande amigo navegador e eu chegamos a esta ilha. Depois de longos dias navegando e com os alimentos já se acabando, precisávamos urgente de terra firme para se acomodar. Foi aí que avistamos este pedaço de terra. Quando aportamos neste litoral, ficamos encantados com a majestade da flora. Tudo era lindo, porém havia algo de estranho. Não víamos nenhum animal ou gente que pudéssemos falar. O lugar era silencioso demais. Eu não sou muito amigo dos pássaros, eles tagarelam muito, no entanto um lugar sem eles é sinal de um lugar astuto. Pássaros percebem o perigo muito antes de outros animais.
     Ficamos a primeira semana sem dificuldades, nos alimentamos de frutas. Eu sou lobo, e todos sabem que lobos necessitam de carne, contudo foi difícil achar tal paladar. Então tive que me contentar com frutas silvestres. Tudo ocorria bem até o momento que a Serpente Da Ilha conscientizou-se da nossa chegada. Alguns homens conseguiram evadir-se para o navio e fugir. Poucos remanescentes continuaram na ilha, a maior parte dos que ficaram eram animais, principalmente lobos. Sem saber o que fazer, bolamos um plano para podermos derrotar a serpente; mas ainda não tínhamos visto o animal. Sabíamos que era uma serpente por causa dos altos sibilares que ela emitia. Sabíamos também que não era uma cobra comum, mas um animal extraordinariamente grande.
     - Vamos atacar na parte da tarde, será mais fácil para nós. – Disse meu amigo navegante, um dos humanos mais leais que já conheci.
     - Vai ser um embate árduo, se alguém quiser desistir, use a canoa que fizemos. Porque se for preciso morreremos lutando. – Tentei parecer confiante aos meus companheiros.
     Como eu disse: o navegante era leal, porém os outros humanos covardes fugiram dali e os outros animais também; tristemente até os lobos fugiram, exceto uma. A loba que decidiu permanecer conosco ficou na praia, pois não queria que ela entrasse em combate. Quando chegou a hora do confronto, um temor dominou-me. A serpente tinha mais de cinquenta metros de comprimento. Era uma das maiores cobras que já vi em toda a minha existência. Enfrentamos o animal mesmo assim.
     - Vocês atrevem-se a invadir o local sagrado da grande serpente? – Disse a cobra. – Tolos, se acham que sairão com vida, estão enganados. Esta ilha pertence a mim, e eu expulsei a todos os outros que vieram antes de vocês.
     A cobra nos atacou primeiro. Investiu um golpe potente com sua calda. Eu fui para a direita e o navegante para a esquerda. Investi nela com minhas garras e dentes; meu parceiro desembainhou a espada e atacou o bicho. A serpente era ágil demais e não se cansava. Meu amigo e eu estávamos ficando sem forças para continuar a lutar.
     - Precisamos de uma estratégia se quisermos a vitória. – Disse o espadachim enquanto tentava proteger-se de um ataque da cobra.
     - Tente distraí-la que eu ataco a cabeça e tento decapitá-la com meus dentes. – Falei para ele.
     - Não adianta se esconderem de mim, posso senti-los. – Disse a serpente, presunçosamente.
     Fizemos como o planejado. Porém, mais tarde, se eu soubesse o que teria acontecido, nunca teria dito para que fizéssemos tal coisa. Pois o resultado foi glorioso, mas uma gloria conquistada pela dor.
     Enquanto o espadachim atacava a parte traseira da serpente, ela tentou abocanha-lo com tamanha fúria, foi aí que aconteceu a coisa mais terrível que poderia acontecer; os dentes da cobra cravaram-se na barriga do meu companheiro. A serpente enrolou-se nele tentando quebra-lhe os ossos. A cólera tomou-me por completo; em um ato de bravura cravei minhas garras afiadas e meus dentes no pescoço da serpente. Fora difícil, mas consegui separar a cabeça do animal do restante do corpo. Corri para meu amigo humano na esperança de conseguir ajuda-lo.
     - Vencemos! – Foi tudo que conseguiu dizer, antes que a morte o tomasse.
    *******
     A fogueira estala quando uma chama lambe uma lasca da madeira.
     - Naqueles tempos eu fiquei conhecido como o Grande Lobo Do Mar, pela minha bravura em derrotar a serpente. Ajudei a repovoar a ilha e dar vida para este lugar que vocês vivem hoje. – Digo para meus netos lobos. – Hoje me chamam de Velho Lobo Do Mar, pois estou velho e cansado, mas um dia cada um de vocês vão assumir suas próprias matilhas e fazerem as suas próprias historias. Nunca mais naveguei, porque não achei que seria o correto viajar sem meu fiel amigo, no entanto estou me preparando para a grande viagem.
     - Que viagem é essa, vovô? – Perguntou a lobinha, a única fêmea dos meus netos.
     - A viagem que todos nós faremos um dia. A viagem que meu amigo navegante fez. Dela ninguém escapa, dela ninguém volta.
     Os lobinhos cansados recolheram-se para dormir, eu contemplo o céu. Uivo para a noite e fico pensando no quanto a vida é passageira.
  • Velho quarto

    Entrando pela porta azul, maçaneta amarelada estilo retrô, chão de madeira parcialmente lustrado de vermelho mogno, paredes com vários espelhos enfileirados propositalmente em ângulos perfeitos, a janela que batia a brisa toda tarde, uma estante pequena de moinha com espaços para cd, nela uma pequena porta de vidro com frascos de perfume vazios mas cheios de aroma que só lembrava vovó e barcos ao horizonte, um vídeo cassete em desuso pelo avanço do mundo, mais abaixo e ainda na estante um microsystem azul e um cd que horas funcionava outras não, chão geladinho e a música tocava, deslizava sobre ele como se não houvesse amanhã ainda embriagado pela bela poesia que o som me trazia, pena que o presente daquele momento ficou em um universo paralelo que só quebrando a barreira da velocidade da luz voltaria naquele instante apenas pra fazer tudo de novo com o dobro de prazer.
  • Vida rapada

    Vagner era uma pessoa simples, de uma vida simples, de uma cidade simples e de uma família simples. Era feliz assim e não tinha a menor pretensão de um dia mudar isso.
    Seu cotidiano era: casa, trabalho, casa. As vezes uma reunião com amigos entrava nesse circuito, mas eram raros os casos.
    Mal sabia ele que esse seu pequeno bioma social estava para trocar as mãos pelos pés. Dia mais, dia menos, esse dia chegaria. Não que ele estivesse ciente disso na época, mas algo em nossa vida nos impele a isso. Retorno de Saturno, alguns diriam. E no caso de Vagner foi o dia em que ele foi apresentado a televisão, que por força de presente de aniversário, não lhe poderia negar, pois seria uma desfeita.
    Sim, algo tão banal para alguns, sequer existia em sua casa. Talvez nisso residisse sua felicidade, mas agora eram águas passadas.
    Lá estava ela. Com seu espelho negro e brilhante a cantar como uma sereia.
    O presente era de um vizinho mais abastado, que ele tinha como compadre. Sinceramente não esperava por este mimo, mas ele veio. Não sabia o que fazer. Sua humilde sala de estar não parecia digna de tal objeto. Por fim apenas acenou e sorriu.
    Nunca quis uma televisão, não precisava de uma.
    Ao menos achava que não.
    É aquela velha história do capitalismo: você pode não precisar, pode não querer algo, mas a partir do momento que esse algo é criado, inventado, você passa a não conseguir sobreviver sem ele.
    Vagner até então nunca nem gostava de ouvir falar em cidade grande. Era daqueles que quando perguntavam.
    – Já foi no Cristo Redentor?
    Ele respondia.
    – Não fui e nem quero. Do Rio de Janeiro já me basta o caminho que o ônibus faz quando eu vou ver a minha vó lá em Caxias. Tem tempo que não vou para aqueles lados, mas lembro que era tudo muito feio.
    Porém, agora com a televisão em sua sala, era obrigado a conviver com aquele mundo distante. Novelas fúteis agora faziam parte de seus prazeres diários. Jornais com notícias sobre bairros que antes ele nem sabia que existia agora permeavam sua cabeça com violência e perigo. Coisas que até então nunca fizeram parte de sua pacata vida em sua cidadezinha.
    Mas o que realmente mais o maravilhou foi a descoberta dos filmes. Foi o que fez com que seu pensamento carrancudo e temeroso sobre a televisão começasse a mudar de verdade. Simplesmente adorava os filmes de super-heróis. Assistia filmes e mais filmes daqueles super-humanos realizando tarefas impossíveis com seus poderes místicos, científicos e até alienígenas. Esses últimos, em especial, traziam a sua mente toda uma mitologia de seu cotidiano, já que era usual o avistamento de Óvnis na sua cidade esquecida pelo resto do mundo. Era uma alegria que dava gosto de ver.
    Entretanto, era uma alegria passageira.
    Acabava o filme. Acabava a felicidade. Vinha o desgosto. Desgosto da sua vida simples, de sua cidade simples e de tudo mais o que fosse simples em sua vida.
    Seu Norte já não era mais o mesmo. Seu conceito de vida já não era mais o mesmo.
    Nada do que vivera até então fazia mais sentido. Estava tudo ali. Tão perto e tão longe. Ele via que tudo em sua vida podia ser mais. Ele acreditava fielmente nisso.
    É essa a sensação que a televisão trás. A vida que Vagner conhecia antes dela passa a não ter valor. A valorização da vida é feita por um comercial, uma novela, um filme. Quem antes se sentia bem consigo mesmo, agora se sente incompleto. É um desejo de consumo que só se satisfaz quando se compra algo, que é quando se torna um pouco mais próximo do ser perfeito que a televisão apresenta. Não que as pessoas não devam buscar crescer e ser mais do que eram ontem, mas quando isso se transforma em desespero, o ser humano perde.
    A vida simples de Vagner não era mais o suficiente para ele. Queria mais, sempre mais. Queria conhecer o Rio de Janeiro tão bonito que aparecia nos comerciais. “A Cidade Maravilhosa” com tudo mais o que tivesse direito.
    Até que um dia desistiu do tédio, pegou todas as suas economias e partiu para aventura da sua vida. Conhecer o Rio de Janeiro!
    Nota: “Tédio”. Palavra maldita que até então Vagner desconhecia. Foi conhecer somente através da televisão. Nunca antes ouvira falar disso. Tinha seu trabalho, tinha sua família, tinha seus amigos e de nada mais necessitava para ser feliz. Até que um desejo dentro de si começou a despertar. O desejo inventado e imposto na sua cabeça por aquele aparelho desgraçado. O querer. Querer algo que não se tem e não precisa. Esse é o carro forte do tédio. Um dos grandes vilões de nossa geração.
    Mesmo contra os anseios de sua família, Vagner foi para o Rio de Janeiro. Juntou uma muda de roupa e foi tentar a sorte seguindo o que seu coração mandava. Afinal é sempre assim que os personagens principais das novelas fazem e no final dá tudo certo, não é?! Por que não haveria de acontecer a mesma coisa com ele.
    Chegando lá não houve nem tempo dele se maravilhar com muita coisa. Vagner nunca tinha se sentido tão mal como se sentira ali andando pelas ruas do centro da cidade maravilhosa. Suas construções antigas e imponentes lhe causaram um efeito totalmente reverso ao que esperava. Em vez de se sentir bem consigo mesmo por poder estar ali e ver com seus próprios olhos as magnânimas construções antigas e de tanta história, logo percebeu algo que a televisão não mostrava. O quanto as construções diminuíam a importância do ser humano para o todo ao seu redor. Verdadeiros monstros de concreto e aço tão grandes e ameaçadores à espreita de sua alma fazia com que ele passasse subitamente a não entender o porquê da sua existência. Nunca antes se sentira tão pequeno, tão ínfimo no universo como agora. Tão nada.
    Porém, o pior ainda estava por vir, o golpe fatal em sua autoconsciência.
    Ao virar por uma esquina qualquer se deu de cara a um grupo de mendigos. Na sua cidade isso não existia. Não sabia como uma pessoa podia chegar a tal ponto de sujeira e podridão. Ficou triste por eles e por toda aquela situação. Andou alguns metros até não aguentar e sair correndo sem rumo pelas ruas desconhecidas. Enquanto corria sentia saudade de sua casa, de sua cidade. Enquanto corria, chegou à rodoviária.
    No seu retorno a para casa manteve-se trancado por dias em seu quarto. Sua família estava preocupada, achava que algo de muito sério deveria ter acontecido a ele na cidade grande. Mas, como era de costume, o tempo iria tratar. Era assim que as coisas funcionavam por ali. Com paciência e tempo.
    O tempo passava e passava. Vagner aos poucos voltava a sair de casa, porém claramente já não era mais o mesmo dantes. Sua cabeça funcionava de maneira completamente diferente. Havia presenciado toda a sua insignificância em relação ao mundo e ao universo. Ele desaparecia aos poucos.
    Os áureos tempos de desejar ser um super-herói estacionara num passado distante. Sonhar em voar por aí sem compromisso. Resgatar uma donzela em apuros. Destruir um vilão com seu raio laser. Tudo não passava de infantilidade da sua cabeça. Na verdade, se martirizava por ter sido tão ingênuo.
    Tentava aos poucos por sua vida novamente nos trilhos. Sentia agora saudade de quando tinha toda a felicidade do universo e não sabia.
    Procurou velhos amigos de escola. Reviu antigos amores. Ligou para todos os familiares que tinha pelo Brasil. Retornara seu contato com os humanos. Os mesmos reles humanos que por toda a sua vida estavam a sua volta.
    Sentiu-se bem com isso.
    Os dias iam passando e Vagner devaneando sobre o que ele significava em meio a tudo aquilo.
    Certo dia resolveu dar uma volta pela pracinha de sua cidade. Toda cidade pequena tem sua praça. A praça na qual toda a cidade crescia envolta, digna das mais ínfimas lendas e causos. Em sua cidade não era diferente. Jardins espalhados por todo o seu entorno, uma igrejinha caindo aos pedaços, alguns banquinhos e alguns jogos de cadeiras e de mesas de cimento com tabuleiro de damas e xadrez de alvenaria. Um parquinho. Isso era tudo que tinha por ali. Este provavelmente era o maior tesouro da cidade e ninguém dava muito valor, Vagner somente o percebera agora.
    Era uma noite quente e estrelada. Vagner botou um chinelo e uma bermuda qualquer e foi divagar pelas bordas da cidade que tanto conhecia. Era um “Oi” aqui, um “Boa noite” ali, e por assim foi. Chegando na praça notou nas crianças que brincavam no velho parquinho. Toda pracinha que se preze há de ter um parquinho velho e cheio de nostalgia acumulada das pessoas que por ali passaram e deixaram um pedaço da sua infância.
    Sabe aquelas ideias que vem na nossa cabeça sem o menor sentido do por que ela estar ali, e logo naquele exato momento onde nada levaria um ser humano dentro da sua sanidade mental a pensar naquilo?
    Pois foi mais ou menos isso o que ocorria com Vagner nesse momento. Pode-se até dizer que foi vítima de uma epifania psicodélica qualquer, mas vá saber.
    Neste exato momento foi como se o tempo parasse para ele. As crianças que saltavam de um lado para o outro alegremente na praça pareciam ter combinado de brincar de “vivo ou morto” bem nessa hora, pois estavam fazendo um magnífico “morto” onde nada nem ninguém se movia.
    A mente de Vagner finalmente tornava real algo que ele tanto almejara dentro de si.
    Ele possuía um superpoder.
    Seus olhos ficaram marejados.
    Percebia agora que possuía o poder da “Invisibilidade Imposta”.
    Sempre o possuiu na verdade e nunca dera conta, assim como todo e qualquer ser humano ali em sua cidadezinha. Um pensamento que espreitava sua mente ultimamente explodiu.
    – Somos todos invisíveis!
  • vilão 1

    Vilão

    Substantivo:
    masculino Natural ou habitante de uma vila.
    Personagem que traz consigo a representação da maldade numa narrativa (filme, novela, série, livro etc.): O ator fará um vilão no próximo filme.
    Quem tem ações vis, abjetas, buscando prejudicar alguém; desprezível.
    Aquele que não é nobre; desprovido de nobreza; plebeu.
    Quem se comporta rústica e grosseiramente; rústico.
    Adjetivo:
    Que busca prejudicar alguém com ações vis.
    Que é grosseiro ou desprovido de nobreza; rústico, plebeu.
    Que habita numa vila.
    Etimologia (origem da palavra vilão). Do latim villanus, "morador de uma vila".

    — Olá! É um prazer finalmente lhe conhecer, não precisa ter medo, posso imaginar que deve ter escutado milhares de histórias a meu respeito, asseguro que a maioria não passa de frutos da imaginação de um bardo qualquer. Como pode ver não sou o monstro que dizem, sou apenas um homem assim como você, então por favor sente-se.
    Já ouvi várias dessas mentiras, então deixe-me esclarecer algumas para evitar futuros mal entendidos. Não devoro as entranhas de meus inimigos ou me banho em seu sangue, isso é nojento demais além de uma imensa falta de higiene, sempre queimo os mortos dando assim um enterro de guerreiro para eles evitando dessa forma que a terra seja contaminada com doenças e pestes. Aprendi isso com um amigo muito inteligente que me ensinou diversas coisas.
    Nunca raptei a filha do duque de verlasque a jovem estava prometida a um homem a quem não amava, então a pedido de uma pessoa importante fui resgatá-la se após isso recebi uma pomposa recompensa que culpa tenho? A respeito do massacre de milhares de soldados dos marqueses de Cica e Lucien mal havia 500 soldados e não foi por falta de aviso, ambos sabiam que os anões do forte da montanha eram livres e honestos, tudo não passou de um plano para roubar a riqueza daquele povo se depois que os ajudei decidiram jurar lealdade a mim, foi por escolha própria. Garanto que jamais machuquei ninguém que não tenha tentado o mesmo comigo ou a minha família.
    Vou logo avisando que não sou um mestre das trevas que consegue trazer os mortos de volta a vida, os deuses bem sabem quantas vezes quis que isso fosse verdade, contudo a morte é uma sentença irrevogável. Sim, tive que ser cruel, queimei vilas, destruí famílias e posso dizer que jamais tive prazer nesses atos… Bom, talvez uma ou duas vezes, porém sabe o que ninguém fala? A respeito do rei Henrique, aquele déspota e o que ele fez na pequena vila onde nasci e a minha amada. Se qualquer homem tivesse passado o que passei, também se tornaria uma pessoa amarga e vingativa. Então para acabar com esse mal-entendido que lhe convidei para vir até a minha humilde residência, o maior cronista que o continente já conheceu. Estou cansado de todas essas mentiras, Hoje contarei o motivo que me fez ser quem eu sou, de como fui traído e injustiçado por aqueles a quem um dia chamei de amigo e o porquê de eu ter tomado o caminho que nos trouxe até aqui onde me tornei "o Vilão.”
  • Vindicta

    [...]
    - Senhor... Lady Vane está... O que diabos aconteceu aqui?
    - Ele não pode suportar a dor... Tirou a própria vida.
        Houve um tempo em que éramos conhecidos como a suprema dinastia, mas agora, sou último dela. Nós Venuanos éramos fortes, poderosos. Qualidades que toda boa família sonhava em ter. Até que... Todos, salvo eu, foram assassinados. Há muita coisa para ser contada, então... Comecemos de onde tem de começar, do começo! Sóis e luas atrás, nós Venuanos vivíamos no reino de Miac, uma terra peculiar diria eu, coisas estranhas e brutais aconteciam, todos sem explicações. Falando em coisas estranhas me recordo de uma história, talvez não queiram saber, não é muito importante? Curiosos? Se aquietem! Tudo beeem! Dir-vos-eis de que se trata. Repito novamente, não é importante, apenas é a história de como toda minha família foi assassinada... Espere! Sim, isso é importante, como pude confundir-me? Certo, vamos lá. Residíamos em um palácio demasiado grande, com um jardim que se estendia além do horizonte, havia árvores de palmeiras gigantes, a grama variava entre um verde fraco quase sem cor e terra marrom, um tom claro semelhante ao verde dos olhos Venuanos. O céu de Miac, o reino usurpado dos Venuanos, o céu que, reluzia uma luz deveras calorosa e revigorante, dia após dia, noite após noite. Havia uma paz no reino, uma paz que durara décadas desde a grande revolução, assim chamada pelo meu pai que, era ainda jovem quando seu pai tomara para si o reino. Anteriormente havia os Garianos, um povo rude e asqueroso. Tipicamente brutal. Há um ditado em minha famíl... Havia um ditado em minha família que dizia “Um Gariano a menos equivale a uma erva daninha em um campo”. Durante muito tempo acreditei nisso, mamãe contava histórias que meu pai a contou e que o seu pai lhe contara quando ainda criança. Dizia que eles possuíam pares de chifres, unhas enormes que dilaceravam a carne igual dentes de leão corta a carne de sua presa. Essa ideia perturbadora me assombrava todas as noites, da minha infância até a quase juventude. Certo dia quando ainda brincava com os cavalinhos de madeira que mamãe tanto zelava, não pude conter-me com uma curiosidade. Tinha à frente do reino, além das muralhas, uma floresta, mamãe mesmo contava em suas histórias que lá viviam eles, os Garianos, dizia-me para não ir para lá, pois eles iriam cozinhar-me em um caldeirão. Ria-se em seguida dizendo “Ah, mas quem iria comer você? Só tem ossos” De fato... Só havia ossos... Retornando a história... Não pude conter-me, a meia-noite, quando a guarda-da-muralha estava distraída com as belas damas que tomavam ar fresco nas suas graças, sai pelo portão grandioso de madeira, Porem quanto mais grandiosos, mais falha terá. Havia uma estreita abertura, na qual pelo meu físico consegui atravessar sem o menor esforço, em questões de minutos já me encontrava meio caminho andado, olhava para trás com euforia enquanto dava curtos e rápidos passos, quando me aproximei das gigantescas árvores, um súbito arrepio na espinha me deu. Foi como se os fantasmas da infância voltassem em massa nos meus pensamentos. As histórias de mamãe pareciam cada vez mais verdadeiras ao passo que me aproximava daquelas altas e expeçam árvores, a visão entre elas era mínima, seria como mergulhar na escuridão. Parei mais rápido do que consegui correr. Observei aquele lugar totalmente opaco, virei-me para o reino, não havia alarme algum “O filho do rei sumiu e ninguém vem atrás? Isso é vergonha” Era meu pensamento. Talvez por que ensejava que alguém interrompesse aquela loucura, eu era demasiado inocente, um tanto tolo, porém inocente. Não havia uma alma mais pura que a minha. Dei mais algumas olhadas, todavia parecia que a floresta me puxava, algo nela me atraia. Algo inexplicável. Simplesmente adentrei-a, por segundos formulei as horrendas imagens que mamãe me contava, sentia que minha carne seria retirada de meus finos ossinhos, que iria arder em água quente para ser devorado... Engolia o ar seco que se enrolava em minha garganta. Eu sentia o suor frio escorrer-me o rosto e as mãos estremeciam. O que tinha eu de arma? “Poxa, esqueci a espada de madeira, como poderei lutar?” Alguns passos na escuridão e avistei uma luz densa verde. Aproximei-me receoso, estava certo que teria meu fim, entretanto para minha surpresa eram apenas sapos, sapos luminosos que pareciam dançar sincronicamente, semelhante à valsa das deusas Henota e Jenida. Os bichinhos eram verdes e peculiares, brilhavam como as estrelas. Achei-me em uma situação que já não conseguia pensar em nada, apenas direcionava-me minhas com as mãos àquela dança anfíbia. Quando toquei suas costas, senti algo puxar-me pelo ombro, uma mão áspera, no momento me lembrei de mamãe... Os Gerianos iriam comer-me... “Estás endoidecendo? Estás encrencado moleque, muito encrencado!” Disse Harlor, rei de Miac, também meu pai. Chegando ao palácio iniciou-se uma discussão... “Esse garoto está para deixar-me louco Vane, louco! Já não bastam as peripécias, as... As... As balbúrdias” “Não fale isso, ele é nosso filho, nosso garoto, és apenas curioso!” “Curioso? Esse garoto é um travesso, não sei o que me deu para não enfiar-lhe uma lamina no peito... Ora essa, agora quer ir para a floresta? Vai-te, ao menos não preciso quebrar a cabeça com um pirralho grotesco” Eu ouvia quieto, sabia que tinha feito por merecer, mas era inevitável que uma ponta de rancor e ódio crescia em mim naquele momento. Em seguida chegou meus irmãos, Goer e Hans, ambos jovens de uma beleza extraordinária e intelecto excepcional, porém franzinos e nada aptos para guerra. Apesar de terem uma personalidade deplorável, eu os admirava, queria ser como eles. “Logo repensava em meus sonhos quando me diziam à mesa do jantar: “És um monstrinho V, tens uma testa grande, caso fosse marrom, diria que estava à frente dos portões” E riam-se. Logo mamãe os interrompia dizendo: “Calem-se, deixem seu irmão em paz, não veem que ele será o cavaleiro do Midhy”? Olhava-me piscando, em uma espécie de símbolo afetuoso maternal. Papai, no entanto retrucava “Estás a delirar querida, não passa de um travesso magricela” Eu ria, mas no fundo, durante noites ficava a pensar “Sou um monstro? Por que não tive a sorte da beleza ou da sabedoria? O que fiz eu para merecer isso?”... Continuando, entraram no recinto meus irmãos, mal sabiam da história e já me atacaram com palavras de fúria, muitas apenas por diversão “Eu não falei? Mate-o papai, apenas nos traz problemas, quer chamar a atenção, mate-o, queime-o!”- Disse Goer. Já o outro era mais dócil “Queimar? Estás maluco Goer?...” Por um momento abri um ligeiro sorriso... “Queimar deixaria o reino empestado com seu futum, melhor seria envenena-lo!” Meu mundo caiu por completo, me senti uma escória, apenas retirei-me, achando inocentemente que se importariam, mas apenas olharam-me com um olhar de nojo, de repúdio! Estava decidido que ali não era meu lugar, por algum motivo desconhecido me odiavam. Não suportava mais. Subi rapidamente para meu quarto, chegando lá, quando estava arrumando alguns utensílios em minha pequena trouxa, senti minha mão formigar, como se estivesse queimando por dentro, um sebo verde e luminoso havia nela. Mamãe entrou no quarto em seguida, com um olhar de dó que me fazia sentir um leve ódio. Perguntava com ao menos uma lágrimas  nos olhos o que estava a  fazer, eu dizia com uma falsa serenidade que estava a partir. Não demorando muito tempo arrumei-me, recebi o seu beijo quente na testa. Vane... A única pessoa que me amara por compaixão.  Sai... nem mesmo um até logo recebi... Não sabia onde iria, estava apenas com a alma ausente, por não nem mesmo saber quem era eu... Andei... E andei para a escuridão.
    Depois de muito tempo retornei à Midhy. A juventude já se mostrava em minha face, os olhos já não conservavam o verde puro, deu-se o lugar a um negro fosco. Juntamente de mim estava um amigo, um verdadeiro amigo. Era um tanto misterioso, andava sempre com uma longa capa carmesim, seu rosto ofuscava-se na escura penumbra do capuz, sua voz se misturava a grunhidos muitas vezes impossíveis de entender. Não falávamos muito, não agora... Conhecemo-nos em uma taverna, dizia que estava a caminho de Miac, tinha contas pendentes, contas antigas... Quando chegamos aos portões nos separamos. No momento que sumiu de minha vista um dos soldados me abordaram “Quem és tu?” Ergui minha cabeça de modo que os não tão longos cabelos revelaram minha face, apesar da juventude, reconheceram-me. Era um milagre... “O filho desaparecido do rei retornou!” Todos aclamavam. À porta do palácio fui recebido por nada mais nada menos que a ilustre realeza. Respectivamente: Goer, Hans, Vane e Harlor. “Meu filho! Quanto tempo!” Disse Harlor, calorosamente abraçando-me, “De fato, pai”- Respondi-o, retribuindo o abraço pouco menos caloroso. Em seguida vieram Hans e Goer, abraçaram-me também e disseram uma ou duas palavra como: “Sentimos saudades monstrinho... quer dizer... irmãozinho” - Dando gargalhadas sempre. Por último veio Vane, ela que, na infância deu-me todo o falso, mas caridoso afeto que nunca tive. Abracei-a do mesmo modo que me abraçara quando criança. Entramos, chamaram às criadas. As mesmas mostraram-me os aposentos, como eu não conhecesse... Depois de um longo e angustioso banho desci já à noite ao baile. Iria ocorrer uma grande comemoração em minha homenagem. Talvez a maior... Três leitões e meia dúzia de galinhas foram sacrificados para a ceia. Após o jantar, que por sinal comi pouco, fomos ao salão principal. Via os corpos cintilantes movimentando-se, Harlor no trono observa-me ininterruptamente, levantou-se e veio andando até mim. Juntamente Goer, Hans e mamãe sempre atrás. Andei também em sua direção, o calor aumentava ao passo que me aproximava da mesa, havia algumas sobremesas, queijos e etc. Quando Harlor cogitou em falar-me algo consolador, logo o interrompi “Não precisa explicar papai, eu sei... Eu lhe perdoo” - Inquieto, porém disfarçando deu-me uma risada e saiu. Quando Harlor deu as costas agarrei uma lâmina que estava à mesa e desferi em sua direção... Sim, um homem encapuzado tentou matar Harlor, salvei-o, o mesmo ficou perplexo, imóvel por um tempo. Retirei a lâmina ensanguentada que caíra no chão derramando o líquido vermelho escuro e viscoso ao redor do cadáver. Depois de um tempo a guarda, que não por sinal não era tão guarda assim, chegou. Reviraram o corpo e logo identificaram de quem se tratava o suposto assassino. Era um homem que há pouco tempo chegara ao reino, usava capa carmesim e seu rosto era grotesco. Sim... Sem dúvida nenhuma era um Gariano, o último que ninguém sabia da existência. Disseram também que estava ali para cobrar uma divida, Porém acharam que se tratava de dinheiro... Harlor ainda assustado olhou-me, com um olhar diferente, um olhar de confiança, como se tivesse renascido para ele... Todos também me encaravam, Goer e Hans que murmuravam coisas como: “Assassino, mentiroso, quis se aproveitar para tomar o trono”. Eram uns invejosos... Dias depois fui proclamado como braço direito do rei. Como Goer e Hans ocupavam esse posto anteriormente, viraram contadores.
    “Em certa manhã caminhando pelo lindo jardim, ouvi vozes por de trás dos grandes pilares. Eram vozes conhecidas... Aproximei-me e estavam lá eles... Conversando escondidos, como se não quisessem ser vistos, ouvi pouco, mas esse pouco me serviu para tirar sérias conclusões... Estão armando contra o senhor, Harlor...”“ O que? Esses desgraçados. Nunca confiei neles... Estás certo do que estás falando filho? Goer e Hans são espertos, não fariam isso...” “Não posso afirma-lhe, pois são seus filhos e eu entendo isso, não quero me precipitar sobre nada, mas me senti no dever de avisar-lhe...” “Estás certo, certíssimo! Obrigado filho. Amo-te” - Estava a me virar quando o disse: “mais uma coisa...” “Sim meu filho?” “Caso nega-se a acreditar, acho que deves ver com seus próprios olhos, assim não viveras com essa duvida em seu coração... Vá atrás da sexta coluna, próximo às grandes fontes ao anoitecer” - “Verei...” - Ambos se despediram com um simples aceno e viraram as costas andando em direções opostas. Ao anoitecer estavam Goer e Hans conversando atrás do sexto pilar perto das grandes fontes. Discutiam inquietos e ansiosos. “Hans, tens certeza que aquela carta que recebera não era golpe? Tens certeza que tinha o nome da pessoa e local de encontro?” Perguntou impaciente Goer. “Cale-te, não sou asno, tenho certeza do que li, dizia certo o local, já o remetente era desconhecido” - Respondeu um tanto nervoso Hans. “Sabe Hans, estava essa noite pensando sobre o assunto de outrora, achas mesmo papai um bom rei?” - “És relativo meu caro, és relativo... Papai é bom, mas apenas no que foi treinado para ser, um brutamonte, um ogro. Não vês suas mãos? São calejadas das batalhas, ainda hoje as conserva... Digo... Como líder de guerra é nato, todavia como do povo não tem aptidão. Por isso necessitava de mentes como as nossas, trabalhando em conjunto. Éramos invencíveis, mas nosso irmãozinho querido tomou-nos o lugar, sabe por que meu caro? Por que nosso pai admira os brutos, homens das cavernas se entendem com os seus. Por isso digo-lhe, temos de retirar aquele monstrinho do cargo...” Após essas últimas palavras, Harlor revelou-se atrás das colunas. Os irmãos não perceberam a presença do pai e se assustaram. Logo disse um deles “P...Pai? Estavas aí? O que ouviste?” -  O não tão velho rei respondeu, com um ar impetuoso “ O que ouvi? O que eu ouvi?! Oras, ouvi o precisava ouvir!”  “Mas... Pai...” “Cale-te! Eu confiava em vocês, como puderam? Depois de tanto tampo... O perigo estava à minha frente e não percebi... Ele estava certo sobre vocês. Traidores!”  Com as últimas palavras todos os camponeses apareceram para ver do que se tratava o furdúncio. Olhavam com um ar de dúvida e conjecturas. Em seguida, rapidamente apareci, estava com um falso ar de questionamento, tentando acalmar Harlor. Ele que estava furioso e Goer e Hans sem entender nada diziam: “O que estás a acontecer meu pai? Traidores? Estás a caducar!” - Com mais ira o rei berrou - “Cale-te, vão morrer, não me importo se são meus filhos, irão morrer!” - Todos se admiraram com a pronúncia, principalmente Vane que chegara mais confusa que seus filhos... “O que está acontecendo aqui?” “Papai está louco” - Respondeu um dos irmãos - “Diz coisas com coisas, fala que somos traidores, que irá executar-nos” Vane voltou-se para Harlor que a olhou nos olhos e disse sério e ofegante: “Seus filhos... Seus filhos são uns covardes traidores, irão queimar!” - Vane logo se aproximou berrando - “Estás maluco? Não podes fazer isso, por qual azo pensas nisso?” “Pelo motivo de estarem conspirando!” - Respondeu o velho, sendo contido pelo caçula “É mentira, estás a blasfemar!” – Vane se virou para os filhos, desesperada e com um pingo de fé “Diga que é mentira, por favor, diga!” “Claro que é mamãe, esse velho está maluco” - Respondeu Goer fitando-o. “Velho? Isso é que pensas? Sou velho, mas ainda sei acender fogueiras!” - Disse o rei, retirando brutalmente Vane do caminho e arrastando pelos braços Goer e Hans até o centro do Jardim, onde haviam antigos troncos usados para incinerar corpos de Garianos na época da tomada do reino. Primeiro ele amarrou Hans com uma corda, que tentou relutar, mas em vão. Apesar de velho, Harlor conservava uma força extraordinária, sem muito esforço amarrou-o. Em seguida foi a vez de Goer que, tentava fugir, porém era também segurado pelos guardas que seguiam ordens do rei. Do mesmo modo foi disposto ao lado do irmão. O Velho rei gritou para todos ouvirem, em um momento de insanidade “Eis aqui dois traidores! Ambos conspiraram e mesmo sendo filhos meus terão o fim que todo traidor merece! A morte!” - No fim de suas palavras, Vane se precipitou em lágrimas aos pés de Harlor, implorando pela vida dos filhos na qual pariu, amamentou e criou com tanto zelo. Ambos estavam amarrados e choravam. Choravam por desespero de perder a vida, choravam em saber que nunca mais teriam os prazeres carnais, choravam, pois viam a mãe se debruçar em lágrimas e choravam por que deixariam o reino nas mãos de um velho louco e um irmão que consideravam mau. Notando suas vidas próximas ao fim, perceberam que a última alternativa seria correr aos meus pés “Irmãozinho, aconselhe papai, eles está ficando fora de si, sentenciar um filho por um crime que não cometera? Isso é hediondo... Por favor, eu lhe imploro, peço perdão por todo mal que lhe causei, sempre o amei... Nós dois o amávamos, por favor, irmão, solte-nos” - Diziam eles, intercalando entre si numa voz rouca e seca. Ouvindo isso abri um ligeiro sorriso e aproximei-me de Harlor. Sussurrei-lhe algumas palavras. Em seguida o rei se pronunciou novamente: “Hans... Você não será queimado... Apenas um serve de exemplo...” o Jovem foi desamarrado e conduzido para o palácio. Em seguida o rei ordenou calmo e sereno - “Queime o outro” - Ouviu-se então por um curto intervalo de tempo os gritos agonizantes de Goer que, queimava dos pés a cabeça em uma labareda diminuía ao tempo que a carne de torrava. Uma cinza espalhou-se ao redor, um silêncio agoniante dominou o local, aos poucos todos foram se retirando. Vane chorou a noite toda, aquela noite tudo ficou sombrio. O céu escureceu-se pela primeira vez em muito tempo, o ar cinzento e fúnebre acentuava a tristeza ali. Estava prestes a chover... Todos estavam em seus respectivos quartos quando o primeiro trovão rasgou o céu acompanhado de longos raios. A água começara a cair... Hans estava em seu quarto na torre lateral, nelas caiam longos cipós que iam até o chão. O horizonte estava escuro e quase não se via nada, nem mesmo a floresta, observava. Deitou-se em sua cama de braços abertos e olhando para o teto, ficou a refletir por um longo tempo... Não parava de pensar nos gritos agonizantes de ser irmão. O céu constantemente clareava em grandiosos relâmpagos, o clarão apenas o fazia relembrar as chamas que tomou o corpo do irmão. Em seguida percebeu uma luz verde aproximando-se dele, não ligou, achou que fosse apenas um reflexo nos musgo causado pelos clarões dos relâmpagos. Estava deveras errado. Quando se deu conta estava cercado de sapos que dançavam em uma sincronia incrível, foi então que notou que os clarões verdes se tratavam dos sapos. Em uma intercalação de luzes claras dos relâmpagos e verdes dos sapos na sinfonia da chuva, os pequenos anfíbios foram tomando o quarto. Apenas flashes de luzes eram vistos por Hans, quando se deu conta já era tarde... Estava sendo “engolido” pelos sapos, que saltavam sempre em sincronia. Apenas ouviram-se seus gritos... Depois um tempo entrou Vane em seu quarto, vira o filho na cama, seu outro filho amado disposto na cama. Com a face sebosa de um verde claro e brilhante que assemelhavam aos seus olhos. Sem ar, ironicamente sem brilho e sem vida...  Era demais para Vane, não aguentaria viver sem quem considerava suas vidas... Acabou por se jogar da torre ao chão, no salto da saudade e desespero de encontrar quem realmente amava...
     O filho caçula chegou ao pai que se encontrava ébrio em seu gracioso trono no grande salão e o disse “Então... Papai... Como se sente? Sem família, sem quem ter para receber ou dar amor...” “Do... Do que está falando?” - Respondeu um pouco confuso por causa da bebida, mas ainda consciente. “Ora, não sabes? Hans morreu envenenado e Lady Vane suicidou-se” - Disse ironizando, caminhando em direção ao velho lentamente. “O que? Estás mentindo... É mentira!” - Respondeu moribundo, soluçando com o álcool “Por que mentiria para o senhor? Jamais faria algo assim a vós...” - Respondeu dando longas gargalhadas que ecoavam pelo salão, ao tempo que a chuva caía constante. “O que estás a falar filho? Eu não entendo” “Ora seu velho! Goer estava certo, estás caducando!” “Olha como fala...” “Olha você, você que mataste minha família... sua dinastia corrupta, hipócrita, Gro... Grotescas!” - Gritou nervoso o jovem. “Família? Eu sou sua família” - Respondeu ainda confuso o velho “ Não percebes não é? Olha bem para esse seu filho, o que vê nele? Não vês a mãe? A minha mãe! Que você estuprou a anos atrás! Quando ainda era jovem...” O Velho fez cara de espanto e ao mesmo tempo de confuso “Diga! Não se lembra? Ao menos tenha a decência de lembrar-te, uma Gariana!” - No mesmo instante o velho levantou-se, tentou caminhar, mas caiu alguns degraus depois. “É, acho que se lembrou... você a violentou e depois de um tempo... Uma criança meio-sangue, nobre e bárbara, nasceu... Eu pai! Agora estou aqui, para pedir-lhe uma explicação... Por que me odiava? Por que me acolheu? Por que matou minha mãe quando ela trouxe-me à sua porta?...” Um silêncio tomou o local, apenas ruídos da chuva ouviam-se. “Responda!” – Berrou o jovem, impaciente. “Vá... Vá pro Inferno, Gariano asqueroso!” “Ah, eu vou sim, mas antes irá você! Encontro-te daqui um tempo velho!” - Foram as últimas palavras do jovem então descoberto Gariano, antes enfiar uma lâmina no peito do seu pai friamente e sem seguida se livrando dela. Passado algum tempo, um guarda adentrou o salão...
  • Você Olhava Para Minha Boca

    As palavras que saem da boca dele deveriam ser minhas. O sotaque dele estraga tudo. Os dentes soltam um assobio estranho, que não combina. O formato da boca dele fica estranho quando fala a letra M. Ele sorri esquisito toda vez que fala a letra T. 
    Essas palavras combinam muito mais comigo. E sabe como sei? Porque todas às vezes que eu falava essas mesmas palavras, você olhava pra minha boca e você não faz isso com ele. Prefere olhar para os olhos dele? Pra fingir que gostou? Ou será que é pra se convencer que as palavras são sinceras? Eu tenho certeza que as palavras são sinceras quando saem da boca dele, mas não soam verdadeiras quando chegam no seu ouvido...Não é?
    É porque essas palavras são minhas. Saem de forma sincera e natural de mim, e chegam a você de uma forma verdadeira e belíssima. Mas não acontece isso quando é com ele. Porque você olhava pra minha boca. Porque focava em cada letra que saía dela. Porque queria guardar elas dentro de você, e agora eu sei que guardou, porque pensa em mim quando ele diz essas palavras. Não é?
    O meu sotaque combina, meus dentes não assobiam, e minha boca não fica estranha porque se encaixa com a sua logo depois de eu pronunciar as palavras:

    Eu te amo...

    Essas palavras são minhas para você. Serão apenas para você, e você só irá receber elas verdadeiramente quando saírem de mim.

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