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A visitante inesperada

Essa é a história do dia em que a consciência me visitou.

Tenho certeza de que todos algum dia, mais cedo ou mais tarde, irão receber essa visita.

Minha história começa quando num momento inesperado a consciência bateu à minha porta.

No primeiro segundo eu me encolhi de vergonha, sem saber o que fazer.

Vergonha de como estava a minha casa, nem um pouco à altura da minha visitante.

Convidei-a para entrar, mais por não poder fugir dela do que por cortesia e o que se sucedeu foi humilhante.

Primeiro, ela me ofereceu um quitute de cortesia que ela disse se chamar realidade. Quando provei senti um terrível gosto amargo que me deixou tonto e confuso.

Depois de entrar ela não poupou comentários cruéis sobre o grande caos que estava em minha casa.

Apontou, irascível, para as teias de aranha que se formaram nas paredes da compreensão.

Passou o dedo no móvel de madeira e descobriu uma grossa camada de poeira feita de mágoas.

Mesmo pisando com cuidado,consegui destroçar uma tábua do assoalho que se quebrou facilmente pelo excesso de orgulho.

Se apoiou na pilastra que segurava o cômodo da sala, que logo estremeceu pela fraqueza de sua fé.

A consciência segui em frente e foi para o quarto. Viu a cama que eu dormia todos os dias forrada com um lençol de egoísmo. No criado-mudo um abajur, que emanava uma luz de falsas verdades; o armário estava todo comido pelas traças do ódio. O mais impressionante ainda estava por vir: a fim de se refrescar do calor, a consciência ligou o ventilador de teto e se assustou com a quantidade de julgamentos e críticas que foram espalhados pelo ar.

Saiu rapidamente dali e segui para o banheiro. Lá encontrou  os pisos que um dia foram brancos, cheios do lodo de mau-humor.

No vaso sanitário, a descarga do perdão não funcionava, fazendo com que os excrementos vazassem pela borda e sujassem ainda mais o chão.

Sem suportar o cheiro a consciência saiu correndo dali e foi para a cozinha, cheia de esperança de encontrar pelo menos um cômodo da casa em bom estado de conservação. Ledo engano.

Quando chegou, viu uma pilha de louças de acusações que se amontoavam sobre a pia. Do lado, uma garrafinha do detergente do respeito parecia nunca ter sido usada.

Correu os olhos pelo ambiente e se deparou com a ferrugem do coitadismo que corroia toda a lataria do fogão, em que se cozinhava, numa panela bem grande, uma sopa feita de vaidade.

Nas estantes, vidrinhos de tempero recheados de otimismo, solidariedade e bom-humor mofavam por falta de uso. Vasculhou um pouco mais e quando abriu as gavetas, não encontrou nenhuma colher de generosidade, só achou garfos de críticas e uma faca ainda suja com o sangue do coração de um pobre coitado qualquer.

Arrasada,a consciência voltou para a sala e me perguntou com lágrimas nos olhos porque eu havia cuidado tão mal do meu lar. Eu, envergonhado, só abaixei a cabeça, sem saber o que dizer, ainda sentindo o gosto amargo da realidade que ela havia me trazido.

Depois de alguns segundos de silêncio, a consciência arregaçou as mangas e me disse:

- Pois é, amigo, temos muito trabalho por aqui. Vou precisar que você arrume para mim uma vassoura feita com perdão, um balde de paciência e um esfregão regado à humildade[...]

E foi assim, bem mais difícil do que parece, que a consciência me visitou e até hoje eu permaneço nessa eterna faxina.

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Atualizado em: Seg 27 Jun 2011

Comentários  

#2 Marlende 03-09-2012 07:30
Adorei, ótima leitura, expôs com clareza o que todos vivenciam, e muitas vezes ignoram...Paarabéns !
#1 tania_martins 01-07-2011 11:10
Parabéns!
Abraços.

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