- Minicontos
- Postado em
Imortal - Monstros - part.1
Sempre preferi dias de chuva do que dias de sol. Sol, a estrela mãe. Aquela que nos da vida a todos os nós. Radiante. Que faz todo florescer. Da cor e brilho as manhas de primavera. Oferece refugio nas tarde de Outono. E no inverno faz a suas aparências relâmpago para por todo o mundo a sorrir novamente. Gosto de pensar que ele é uma donzela que se sacrificou para dar vida a todos aqueles que não a merecem. Sim porque para ter todos esses atributos tem que ser algo realmente especial.
Vivo desde de sempre sobre o seu manto. De certa forme o folclore europeu o tornou o meu melhor aliado. O meu protector. Aquele que me esconde entre as multidões. Apesar disso sempre foi apaixonado pela chuva. Chuva, aquela que nos permite chorar na rua sem que ninguém se descubra a nossa dor. Aquela que da de beber as flores e chama os pássaros para um passeio. Como dizer que não a um longo passeio de mãos dadas sobre a chuva. Nossos pés mergulhados em agua. Nossas roupas unidas a nossa pele fria. Procurando o calor do outro, ao lado de uma lareira que arde lentamente. Se o sol é uma donzela a chuva é o cupido que junta os nossos corações.
Ao mesmo tempo chuva unida ao manto da noite se torna numa dor aguda que percorre todo o meu corpo, subindo pela minha garganta, saindo, gritando por minha cordas vocais. Um grito de desespero. Um grito que acorda memorias de um monstro. No fundo somos todos monstros. Apenas não o sabemos. A maior parte tem sorte em não viver o tempo suficiente para o descobrir.
Com o passar dos anos o monstro cresce dentro de nos. Se alimenta da nossa tristeza. Do buraco deixado pela felicidade que nos foi arrancada de nos cedo de mais. Essa é a sua refeição preferida. E quando cabra os seus dentes nela, nunca mais larga. Nunca mais fica saciado. É dono de uma fome infinita. Aos poucos ele sai de dentro de nos. Aos poucos nos controla. Coisas simples o inicio. Coisas que nos até gostamos. Não vemos a maldade nelas. Ir a um bar beber uns copos, fingir que eles tem algum efeito sobre nos. Pegar na companheira do vizinho e a levar para casa. Não chega a chegar a cama. Mal a porte se bate em nossas costas, começa. Ofendo orgasmos a essas mesmas companheiras em troca de nada. Ele oferece seu orgasmos a nos. Seus portadores. Nos faz pensar que é o nosso melhor amigo. Oferece-nos duas, três de uma vez, até chegar a uma orgia. Só eu e elas. Perfeitas, gemendo o nosso nome. Gritando de prazer. Com todo que temos direito, álcool, drogas, fantasias. Todo aquilo que é supérfluo, mas por algum motivo sempre desejamos ter. Ele nos oferece, sem nunca pedir nada em troca.
Então quando o sol vencido pela chuva tenta eliminar a primeira hora da manha, nos acorda-mos. Mas já não estamos mais em controlo, ele que nos comanda agora. Ao nosso redor estão os corpos frios. Roubados de suas jovens vidas em troca do orgasmos dele. As paredes salpicadas, corpos drenados e o nosso corpo sorrindo para o espelho. Mas aquele sorriso não é nosso. Nos choramos em silencio dentro do nosso corpo.
Quando se vive tempo suficiente para conhecer o monstro que somos...